censo demográfico

'Estamos vivendo uma crise de desinformação' , diz professor sobre cancelamento do concurso do IBGE

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Os principais levantamentos acerca do perfil populacional do país - do número de habitantes a aspectos como escolaridade, acesso à saúde e ao saneamento básico, mortalidade e tantos outros - são realizados por meio do Censo Demográfico, aplicado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) desde 1872.  O último foi em 2010, o que implica em vários dados de municípios brasileiros estarem desatualizados há mais de uma década. Santa Maria, por exemplo, já tem população estimada em 285.159 habitantes. Porém, a pesquisa "mais recente" do Censo ainda aponta 261.031 pessoas.

Ocorre que, pela segunda vez, o IBGE se depara com o cancelamento do concurso público para Agentes Censitário e Recenseadores para o Censo de 2022. A informação foi divulgada pelo próprio instituto, ainda na segunda-feira. De acordo com o IBGE, a decisão foi motivada pela não renovação do contrato com a Cebraspe - empresa responsável pelo certame.

Em abril, já havia sido divulgado o adiamento do Censo de 2020. Segundo o governo federal, os motivos foram em razão da pandemia e por falta de orçamento - esse sancionado com vetos que resultaram em cortes expressivos de recursos para políticas e programas. À época, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) vetou R$ 29,1 bilhões do texto proposto pela Câmara dos Deputados para o Orçamento de 2021. Entre os cortes, incluíam R$ 17,75 milhões que seriam destinados à realização do Censo. O ministro da Economia, Paulo Guedes, já havia defendido o adiamento do estudo.

Na manhã desta quarta-feira, em entrevista ao programa F5, na rádio CDN, o professor de Geociência da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Adriano Severo Figueiró, falou sobre o assunto aos jornalistas Cassiano Cavalheiro, Marcelo Martins e Pâmela Rubin Matge.


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O cancelamento do concurso reflete, principalmente, em prejuízos na distribuição de recursos aos municípios e na implementação de políticas públicas, o que inclui dados sobre a cobertura vacinal, dos índices de alfabetização e fome no país, bem como quantas e onde é preciso mais escolas, mais médicos ou centros hospitalares

- Essa notícia é mais um episódio dessa epidemia de desinformação que nós estamos vivendo no Brasil. Nós sabemos que os dados atualizados para qualquer país são a base do planejamento das políticas públicas. Por exemplo, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), de 2019, apontou que 51,2 % da população adulta brasileira não completou a Educação Básica, mas nós não sabemos onde estão essas pessoas, assim como não sabemos sobre os 11 milhões de brasileiros acima de 15 anos que não sabem ler nem escrever. Isso é a população do Rio Grande do Sul, é um Estado inteiro e, se não soubermos onde moram, não temos como fazer uma política direcionada. Se você não tem dados, você caminha às cegas, então,você faz a política pública de ocasião. Estamos vivendo uma crise muito séria de desinformação - critica Figueiró.

IMPACTO AOS PEQUENOS MUNICÍPIOS

Do ponto de vista de recurso às pequenas e médias cidades, Figueiró enfatiza que é dever de prefeitos e governantes pressionarem para a realização do Censo:

_ A falta de um censo prejudica especialmente os municípios pequenos e médios. Nos grandes, principalmente nas Capitais, existem outras pesquisas, como a Pnad, direcionada a grandes centros. Efetivamente, esse apagão de informações se dá mais no Interior. Isso significa que há 11 anos, o Fundo de Participação dos Municípios (FPM) não se altera. Estamos falando em nível de Brasil de R$ 350 bilhões de FPM.

À iminência da fome, 21 mil pessoas vivem com renda de até R$ 89 por mês em Santa Maria

O processo para atuar no censo do IBGE é desenvolvido por meio de uma mobilização de um a dois anos, com treinamentos e amostragens de testes. Neste período, houve migrações internas, saída de pessoas das grandes cidades para o Interior e demais fatores, que mudam completamente o perfil dos municípios brasileiros. O cancelamento do concurso e a defasagem das estatísticas afeta também as universidades e a pesquisa científica:

_ As pesquisas realizadas no campo socioeconômico levam em conta comparações de uma década para outra, ou até, de um país para outro. Já no momento que se é perdido essa periodicidade dos dados, essas comparações não podem ser realizadas. Essa situação já tinha sido vista no período de Fernando Collor de Mello, que acabou não realizando o censo em 1991, como era planejado e, no fim, gerou a quebra de uma época _ pontua Figueiró.

SEM ATRATIVOS À INICIATIVA PRIVADA

Outro ponto em questão são os impactos econômicos e os investimentos privados. A propósito, conforme o especialista, quando um país não possui um censo atualizado, ele automaticamente se equipara a países falidos ou em guerra:

- Qual é a grande empresa que vai querer investir em um país, que ela não tem informação, que não se sabe onde está o mercado consumidor, o poder aquisitivo dos municípios e qual é a renda média do país?- relata o professor.

O CONCURSO

Ao total, o IBGE estava disponibilizando 204 mil vagas para a realização de pesquisa demográfica no ano que vem: 108 oportunidades para recenseadores, 5,4 mil para agentes censitários municipais e 16 mil para supervisores, com salários entre R$1,7 mil e R$2,1 mil.

O instituto informou que irá devolver o valor das inscrições para os candidatos que já realizaram o cadastro da prova, no entanto, os trâmites para reaver esses valores só serão divulgados nos próximos dias.

Conforme o coordenador de área da Agência do IBGE em Santa Maria, Mário De Avila, apesar do cancelamento, já estão sendo adotadas as providências para nova seleção de empresa organizadora do processo seletivo para o Censo 2022:

_ Ao meu ver, no momento foi interrompido um contrato. Será contratada uma nova empresa e isso não deverá impactar no início do Censo. Estamos dentro do cronograma. 

COLABOROU EMANUELY GUTERRES

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