O idoso hospitalizado

José Carlos Campos Velho

Shannon Brownlee é uma jornalista americana que colabora com o Instituto Lown, criado por Bernard Lown, médico cardiologista lituano, que migrou para os Estados Unidos, onde trabalhou em Boston, na Harvard Medical School, por mais de cinco décadas. Lown foi agraciado com o prêmio Nobel da Paz, por seu trabalho frente a uma instituição que criou, Associação internacional de Médicos Contra a Guerra Nuclear. Com os recursos obtidos pela premiação, Bernard Lown criou o Instituto, que propõe uma medicina humanizada, centrada no paciente, particularmente voltada para a justiça social e o combate ao excesso de uso de recursos médicos, que podem às vezes serem mais deletérios do que benéficos, bem como ao seu subuso, principalmente em situações de maior vulnerabilidade social. Shannon Brownlee escreveu um livro chamado Overtreated (Tratamentos Demais). Um de seus capítulos se chama The Most Dangerous Place – o lugar mais perigoso.


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Ambiente hostil

Vocês podem imaginar de que metáfora estamos falando. O hospital moderno salva vidas, estabelece diagnósticos difíceis e propõe tratamentos de alta complexidade, que hoje podem curar e tratar pessoas com doenças até então incuráveis ou de tratamentos falhos ou ineficazes. Porém existe um aspecto dos hospitais – particularmente quando pensamos em pessoas idosas, bastante questionável, é que de fato o hospital pode ser um ambiente bastante hostil aos idosos. E quanto mais frágil e envelhecida for essa pessoa, essa hostilidade do ambiente pode se fazer mais presente. Um paciente acamado, portador de um quadro demencial, que chega ao hospital por uma infecção urinária, quadro relativamente banal e frequente, pode ser submetido uma série de procedimentos potencialmente capazes de comprometer grandemente sua autonomia. Pacientes com comprometimento cognitivo frequentemente ficam confusos e agitados no ambiente hospitalar, para eles um local pouco familiar, estranho, desconhecido. Muitas vezes, pela agitação, acabam sendo sedados, submetidos à restrição física, o que acaba frequentemente por agravar o quadro clínico. Observa-se aumento do risco do idoso de apresentar lesões por pressão (“escaras”), reações adversas a medicamentos, broncoaspiração, necessidade de passagem de sondas para alimentação e sondas urinárias. O quadro então muito mais do que sob controle pode aparentar como cada vez mais fora de controle. As conversas com o “staff”, por vezes, são telegráficas. Os familiares desconhecem o que está ocorrendo e se sentem inseguros e insatisfeitos. Essa não é uma situação incomum.


Desorientação

A confusão mental associada à desorientação no tempo e no espaço, a dificuldade de manter a atenção, o distúrbio do ciclo sono-vigília e agitação psicomotora são característicos de um quadro frequente em geriatria chamado Delirium. Este quadro pode ter uma contrapartida manifesta por sonolência, apatia e letargia. O primeiro é chamado Delirium hiperativo e o segundo de Delirium hipoativo. Sharon Inoue é uma médica geriatra americana que se dedica ao estudo do Delirium e propõe uma série de atitudes clínicas para sua prevenção. É uma ferramenta por ela desenvolvida chamada Help (Hospital Elder Life Program). O Delirium pode ocorrer em qualquer ambiente, mas os hospitais, particularmente em UTIs e as situações de pós-operatórios, são locais e momentos de alta prevalência.


O treinamento dos profissionais em relação ao seu diagnóstico precoce e seu manejo, a orientação de familiares e cuidadores sobre suas características e evolução podem ser boas estratégias para modificar esse quadro altamente prejudicial aos idosos e que, muitas vezes, pode devolvê-los aos seus lares em situações bastante mais complexas daquelas que os levaram ao hospital. A hospitalização dos idosos deve ser sempre pensada e refletida com bastante cuidado, pois as consequências de uma internação intempestiva podem ser bastante graves para esse segmento etário. Para o idoso, o seu lar é ainda o ambiente mais seguro.

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