José Renato Ferraz da Silveira: Terra-Pátria

Redação do Diário

Prof. Dr. José Renato Ferraz da SilveiraProfessor do Departamento de Economia e Relações Internacionais da UFSM

“O destino da humanidade é desconhecido, mas sabemos que o processo de existir modifica-se”.Edgar Morin

A tempestade é uma força magnifica da natureza: ventos fortes, trovões, relâmpagos e medo. O dia amanhece assim. De repente, não mais que de repente, uma explosão! Um canhão poderoso atirado dos céus. Alarmes soam por todo lugar. A cidade desperta. Alguns gritos sufocados pelo barulho. Silêncio. De súbito, fico tomado por intensas recordações. Talvez seja nostalgia. Um movimento natural ao envelhecer. Rabisco num pedaço de papel: “Nada será reparado e tudo será esquecido”. Mordo os lábios.

Na oração da manhã, conclamo as palavras de Santo Tomás de Aquino: “Dê-me, Senhor, agudeza para entender, capacidade para reter, método e faculdade para aprender, sutileza para interpretar, graça e abundância para falar, acerto ao começar, direção ao progredir e perfeição ao concluir”.

Santo Tomás de Aquino foi o maior expoente intelectual da filosofia escolástica. Fortemente influenciado por Aristóteles, a filosofia dele é fundamental para a Igreja Católica até os dias de hoje. Ele promoveu um debate que ecoa na contemporaneidade: a convergência entre a fé e a razão. Para Aquino, a fé e a razão seriam, muitas vezes, rios que desembocam num mesmo oceano.

No campo da política, Santo Tomás de Aquino compreendia que o homem é um animal social e político, a família é a primeira associação, e o Estado, sua ampliação e continuação.

A partir disso, podemos constatar que os seres humanos – ao longo do tempo – construíram e constroem a ética da comunidade.

As raízes da comunidade mergulham profundamente no mundo vivo. Lembremos que as formigas, os cupins, as abelhas sentem automaticamente a devoção à comunidade.

Os mamíferos, ainda que opondo-se em rivalidades a outros membros da sua sociedade pela alimentação ou o sexo, são solidários pelo interesse comum da defesa ou da caça.

No campo da sociobiologia, dizem os especialistas que existe um gene de solidariedade.

Nas sociedades arcaicas, a solidariedade é cimentada, justificada pelo mito do antepassado comum e pelo culto aos espíritos ou deuses da comunidade.

Pensemos no caso da família. A família é o lugar onde a solidariedade nasce de si mesma. Onde há (ou deveria existir) o amor, do respeito e até do culto prestado à mãe e ao pai. Vale ressaltar que o culto da família alimenta-se do culto dos parentes mortos. Respeito e dignidade aqueles que viveram antes de nós e que viverão depois de nós partimos.

Neste sentido, a ideia de pátria é o mito que alargou ao conjunto de uma nação as características intrínsecas a solidariedade familiar. Ou seja, a palavra pátria contém si a substância materna e paterna. O amor e a obediência da parte dos “filhos da pátria” que são fraternos uns com os outros. Não existe na ideia de Pátria a separação/desvinculação entre eles/nós.

Esta ideia afetiva e efetiva de Pátria esteve presente nas sociedades arcaicas ou tradicionais e buscaram na – medida do possível – trazer para as sociedades nacionais modernas e contemporâneas. Infelizmente, governos nacionais, em diversas partes do mundo, não compreenderam o verdadeiro significado e deturparam o sentido. Na atualidade, no atual desgoverno e demolidor governo Bolsonaro mudaram e usam o conceito de Pátria de forma vergonhosa e infeliz.

A ideia de Pátria está ligada a ética da comunidade no qual é fundamental a empatia, a compaixão, a responsabilidade coletiva e a solidariedade entre os membros.

O pensador francês Edgar Morin entende que esta ética da comunidade pode ser alargada a todos os humanos em qualquer lugar. É a ideia da Terra-Pátria. Não se nega a solidariedade nacional ou étnica. Mas há algo maior. Ela confere à fraternidade a origem necessária da maternidade. Não há irmãos sem Mãe. Nossa Mãe é a Terra-Pátria. Como dizem os autores Valdo Barcelos e Sandra Maders é possível pensarmos numa era de acolhimento, de amor sem exigências e expectativas, de respeito ao outro, de reconhecimento ao outro. Isso é possível?

Texto em homenagem aos sonhadores desse mundo caótico e incerto e ao indigenista Bruno Pereira e o jornalista Dom Philips.

Leia todos os Colunistas

Carregando matéria

Conteúdo exclusivo!

Somente assinantes podem visualizar este conteúdo

clique aqui para verificar os planos disponíveis

Já sou assinante

clique aqui para efetuar o login

UFSM vence a ABF por 4 a 2 pela Série Ouro de Futsal Anterior

UFSM vence a ABF por 4 a 2 pela Série Ouro de Futsal

Diário 20 anos: Santa Maria quer qualificar seus universitários Próximo

Diário 20 anos: Santa Maria quer qualificar seus universitários

Geral