solidariedade

'Brumadinho é outra tragédia que poderia ter sido evitada', diz mãe da Kiss ao retornar para Santa Maria

Gabriela Perufo

Fotos: arquivo pessoal
Flávio e Ligiane em Brumadinho. Ao fundo, bombeiros almoçando no meio da lama

Após quatro dias em Brumadinho, no estado de Minas Gerais, onde o rompimento de uma barragem deixou 166 pessoas mortas, além de outras que estão desaparecidas, Ligiane Righi da Silva e Flávio José da Silva chegaram, na madrugada desta sexta-feira, em Santa Maria. O casal, pais de Andrielle, uma das vítimas do incêndio da Kiss, faz parte da Associação dos Familiares de de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia em Santa Maria, além de ser incansável na luta por justiça no caso Kiss, levou um pouco de carinho e solidariedade para a comunidade que viveu uma tragédia em janeiro deste ano.  

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Acompanhado pela jornalista Daniela Arbex, de Minas Gerais e autora do livro Todo Dia a Mesma Noite, o casal conheceu a população da cidade. Como usavam camisetas que fazem referência a Santa Maria, eram facilmente reconhecidos pelos populares de Brumadinho que, apesar de viver em meio a uma tragédia, foi muito hospitaleiro, conforme conta Ligiane que, em conversa com a reportagem, contou um pouco do que os dois passaram ao longo dessa semana no local.

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Segundo Ligiane, depois de estar no local da tragédia e conversar com a população local, ela chegou a conclusão de que Brumadinho foi mais uma "tragédia que poderia ter sido evitada". Apesar de os locais mais atingidos pela lama terem acesso restrito, o casal acabou circulando por muitas áreas que foram diretamente afetadas. Eles viram, de perto, bombeiros rastejarem, com ajuda de cães farejadores, nas buscas pelos desaparecidos. Uma das cenas que chamou atenção foi ver a equipe de resgate almoçar no meio da lama. O barulho dos helicópteros sobrevoando é som rotineiro já. 

- É muito triste as pessoas ver que tem os mortos e os desaparecidos, e que, sobre os desaparecidos, ainda têm esperança de encontrá-los sendo que, quanto mais o tempo passa, menor a chance disso acontecer - conta Ligiane. 

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Ela, que perdeu uma de suas filhas na Kiss, conheceu outras mães que perderam os filhos em Minas Gerais e também outras pessoas que perderam familiares. Foi aos familiares de vítimas e desaparecidos que ela entregou as mensagens escritas por outras mães de vítimas da Kiss e que levou de Santa Maria. 


- Logo no primeiro dia, conversei com uma mulher que perdeu o filho de 32 anos. O semblante dela parece que ficou mais doído quando eu me identifiquei. Ela disse "tu sabe o que eu estou passando". E eu respondi:  "o que eu posso fazer é te dar um abraço". A gente sabe que não adianta falar. A gente ficou um bom tempo abraçadas e parece que ela estava tensa e chegou a relaxar com o abraço. Se todos fizessem um pouco disso, se se colocar no lugar do outro, o mundo seria melhor - relata. 

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Foto: arquivo pessoal
Letreiro na entrada de Brumadinho virou um memorial improvisado. À direita, camiseta de Janeiro 27, colocada por Flávio e Ligiane

Segundo Ligiane, o cenário em Brumadinho tem alguns pontos semelhantes com Santa Maria, em 2013. Quem não perdeu um familiar, perdeu um amigo ou conhecido. O recepcionista da pousada onde ela ficou, por exemplo, perdeu 30 amigos com a tragédia. Entre os voluntários, bombeiros e familiares de vítimas, Ligiane conheceu Conceição cujo marido está desaparecido. Em meio a tanta dor, Conceição foi muito hospitaleira, como todos, segundo ela conta: 

- Ela estava com a casa cheia e a gente chegou perto da hora do almoço e ela insistiu para que ficássemos. Ela conta que a solidão dela é à noite, quando a casa esvazia, e ela não tem o marido ao lado, na cama. E eu me identifiquei muito com isso. É algo que eu senti também. 

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O choque maior para Ligiane, é perceber que, em sua opinião, a tragédia de Brumadinho será esquecida mais rápida do que a da Kiss. 

- Lá eles falam que a Vale é um mal necessário, agradecem todo o apoio da Vale sendo que tudo que eles tão fazendo é a obrigação. Tem gente que perdeu sua propriedade e fica se culpando porque achou que não deveria ter construído perto da barragem. A gente conheceu pessoas que perderam tudo, estavam com a roupa do corpo, mas eram gratos porque estavam em um hotel. Ou seja, houve uma inversão de valores lá. E por causa disso a gente vê que a tragédia será esquecida, será página virada, muito mais rápido do que a Kiss - lamenta Ligiane. 

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