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“Não tenho mais esperança de colher alguma coisa”, afirma produtor rural que enfrenta estiagem

O cenário é desanimador para quem mora e produz no campo. Isso porque a estiagem segue prejudicando o principal meio de subsistência de muitas famílias. Até o momento, 39 municípios da Região Central do Rio Grande do Sul já decretaram situação de emergência em função da seca e os prejuízos econômicos ultrapassam R$ 3 bilhões. Lavouras perdidas e falta de água são as principais consequências de um período que se prolonga por três anos.

No interior de Agudo, na localidade de Nova Boêmia, o produtor e agricultor aposentado Edir Elson Kegler, 61 anos, relata que teve de abandonar plantações pois não tinha como recuperar a produção. A lavoura de milho na propriedade de Edir está com espigas que não conseguem ser aproveitadas e palhas secas.

– O nosso maior prejuízo é o milho, mas temos outras culturas (afetadas) como abóbora, melancia e fumo. No geral, é prejuízo em toda a extensão da nossa lavoura. Abóbora abandonamos. O feijão foi semeado, mas provavelmente não vai dar nada. Não tenho mais esperança de colher alguma coisa – lamenta Edir.

Agricultor Edir Elson Kegler mostra produção de milho que não tem aproveitamentoFoto: Eduardo Ramos (Diário)

Não é apenas Edir que sofre com a estiagem em Agudo. Os prejuízos na cidade, que conta com 2 mil propriedades na zona rural, já somam mais de R$ 50 milhões. O milho, por exemplo, teve perda de 90%. Todas as principais fontes de renda de Agudo também tiveram danos.

Perdas na agricultura em Agudo

  • Milho – 90%
  • Feijão – 50%
  • Soja – 40% 
  • Morango – 40%
  • Fumo – 30%
  • Arroz – 5%
Plantação de feijão não está germinando como deveriaFoto: Eduardo Ramos (Diário)

Prejuízos na pecuária em Agudo

  • Pastagens nativas – 60%
  • Pastagens cultivadas – 40%
  • Produção leiteira – 140 mil litros

Dados disponibilizados pela Emater de Agudo

Produção de morangos afetadaFoto: Emater de Agudo

Além disso, atualmente, 800 famílias de Agudo estão desabastecidas e recebendo água potável.

Estiagem prolongada é decorrente de La Niña atípico

Há pelo menos três anos, Edir sofre com redução e danos na produção em função da estiagem:

– O prejuízo é anual, então para nós cada ano fica mais difícil sustentar nossa propriedade. Cada ano o lucro é menor, nós precisamos de mais dois ou três anos para conseguir recuperar o que perdemos até hoje.

Conforme explica a professora do curso de Meteorologia da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Simone Ferraz, 49 anos, o Rio Grande do Sul está vivendo essa condição atípica da seca em razão do prolongamento do fenômeno La Niña:

– Faz três anos que estamos em La Niña, um esfriamento no Oceano Pacífico, que como consequência gera pouca chuva no sul e mais chuva no Nordeste. É anormal um La Niña tão longo, costumamos ter períodos de dois anos no máximo. Então, são dois motivos para não ter chuva: um porque é normal não chover nessa época e outro porque estamos com um fenômeno atípico, que também causa diminuição da chuva. Por isso estamos tendo um longo período seco.

Foto: Eduardo Ramos (Diário)

Ferraz esclarece que ainda não é possível saber o motivo do prolongamento do La Niña, já que é preciso esperar o término do fenômeno para analisar os dados. Apesar disso, a professora já antecipa que a estiagem pode ser um efeito das mudanças climáticas. A ideia é que o planeta vive uma situação anômala de elevação de temperatura. A resposta da Terra para isso é promover mudanças extremas, como a seca, para voltar à normalidade:

–  Se estamos em uma situação anormal, que são as mudanças climáticas, devido ao aquecimento do planeta, é de se esperar que a resposta seja uma situação também anormal para voltar ao que se tinha antes.

Até quando vai a estiagem no Estado?

As perspectivas futuras são otimistas. De acordo com a professora, as avaliações da superfície do Oceano Pacífico indicam que as águas estão voltando a temperatura que tinham antes do La Niña:

– Todos os modelos climáticos estão mostrando que o La Niña está finalizando no verão, no máximo início de outono finaliza e entraremos numa situação de normalidade. Isso é o que acontece sempre: temos uma La Niña, um período normal, um El Niño, um período normal, e assim por diante.

Essa pode ser uma boa notícia para os produtores. Edir, por exemplo, solicitou o Proagro (Programa de Garantia da Atividade Agropecuária) nos últimos três anos. Em 2024, ele não poderia pedir novamente. Com a expectativa de finalização do La Niña, a sensação no próximo ano pode ser de alívio para quem trabalha no campo e recorre aos seguros rurais.

Seguros rurais em época de estiagem

O Proagro (Programa de Garantia da Atividade Agropecuária) garante seguros rurais para pequenos e médios produtores diante da ocorrência de fenômenos naturais, pragas e doenças que atinjam rebanhos e plantações.

Vistoria da Emater para avaliar perdas em propriedade rural de AgudoFoto: Eduardo Ramos (Diário)

Em Agudo, cerca de 70 famílias acionaram o Proagro até o momento. O número está próximo dos dados totais do último ano. Para comparação, entre dezembro de 2021 e maio de 2022, foram 100 famílias que pediram o crédito rural. Na prática, existe uma série de etapas até o produtor receber os recursos:

– O produtor vai até o banco, encaminha o Proagro e chegam os pedidos de vistoria das lavouras para a Emater. Então, a gente vem até os produtores e faz essa visita nas lavouras afetadas. Olhamos a área plantada, fizemos fotos da lavoura e da produção, se tiver. Depois disso, a gente gera um relatório, que vai para o banco, que analisa e libera o seguro – informa Luana Fernandes Tironi, 35 anos, extensionista rural da Emater de Agudo.

O que o poder público e a população podem fazer?

A professora Simone Ferraz fala que é fundamental uma campanha de educação ambiental para a população. É necessário economizar água e evitar o desperdício.

Já o poder público, além da distribuição de água potável nestes períodos de emergência, também pode pensar em alternativas de longo prazo. Uma das sugestões de Ferraz é a construção de cisternas nas propriedades do interior para armazenamento de água da chuva. Isso poderia substituir a água dos açudes, por exemplo, que nesta época estão ficando secos.

– Não podemos imaginar isso como um período isolado. Temos visto cada vez mais eventos extremos. É de se imaginar que isso possa voltar a acontecer. O ideal é que a gente esteja preparado para um evento assim e não apenas tente minimizar o problema.

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