saúde

Programa da UFSM incentiva doação de corpos para fins de estudo

Thays Ceretta


Foto: Gabriel Haesbaert (Diário)Estudantes tem aulas práticas com corpos doados

Era dezembro de 2003 quando uma senhora de 70 anos procurou o Departamento de Morfologia da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), no prédio 19, para fazer uma doação um pouco diferente, porém compreensível e necessária. Ela queria doar o seu corpo para ser usado para fins de estudo e pesquisa científica. Maria (nome fictício) foi pivô de um projeto que mobilizou mais pessoas. Na época, o setor buscou uma maneira de legitimar a vontade da senhora que queria ajudar. Segundo ela, como os filhos eram médicos, essa era uma forma de colaborar com a formação de outras pessoas. Foi criado, então, um formulário para que os dados fossem preenchidos. Após o documento assinado pela voluntária e pelas testemunhas, foi preciso reconhecer firma em cartório. Assim, a vontade de Maria estava registrada.

Desde então, existiram outros interesses parecidos com o dela, mas de pouca gente. Até então, o setor fazia seus pedidos junto ao Instituto Geral de Perícias (IGP) para que - conforme a Lei 8.501/1992, que dispõe sobre a utilização de cadáver não reclamado (que não foram procurados/identificados por parentes ou responsáveis legais) - fossem doados os corpos ao Departamento para fins de estudo e pesquisa científica. Porém, no ano passado, surgiu a necessidade de oficializar um programa onde as informações pudessem chegar mais rápidas à população.

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O tema ganhou espaço na lei 10.406/2002 do Código Civil Brasileiro, que diz que é válido, com objetivo científico ou altruístico, a disposição gratuita do próprio corpo, no todo ou em parte, para utilização depois da morte, podendo ser livremente revogado a qualquer tempo. Com isso, em julho de 2016, foi criado o Programa de Doação Voluntária de Corpos do Departamento de Morfologia da UFSM. O professor de anatomia humana da UFSM Carlos Eduardo Seyfert explica que, mesmo que a universidade tenha modelos sintéticos com características muito próximas da realidade, um estudo diretamente no corpo humano prepara melhor o profissional para enfrentar situações adversas.

- Precisamos do cadáver para mostrar aos alunos da área de saúde como é o corpo. Eles precisam sentir a textura dos tecidos, saber a relação que um órgão tem com o outro e como é feita a irrigação do sangue nesses tecidos ou órgãos. Nenhum indivíduo é igual ao outro, e o aluno terá que aprender a reconhecer essas diferenças. É primordial ter aula em cadáveres, para que eles possam saber como é o corpo com que eles irão trabalhar. Tudo em prol do ensino de qualidade. Quanto mais material tivermos, maiores são as chances de mostrar as estruturas ao natural, e precisamos renovar o acervo sempre que possível. E é o que o programa está fazendo - explica Seyfert, que é também coordenador do programa de doação voluntária.


ARMAZENAMENTO 

É no prédio 19, no campus do Bairro Camobi, que os corpos são preparados, conservados e dispostos nos laboratórios de ensino, para serem utilizados como material de pesquisa por mais de 4 mil alunos por semestre. O corpo humano é rico em detalhes que são analisados a cada aula e, se manuseado com cuidado e bem conservado, pode durar muitos anos. 

Quando o cadáver chega, é fixado em solução de formol através da artéria femoral para que penetre em todos os tecidos e garanta a adequada fixação dos tecidos. O procedimento dura cerca de sete horas.

O chefe do Departamento de Morfologia da UFSM, Marcelo Leite da Veiga, afirma que ainda não há falta desse tipo de material, mas existe uma preocupação futura com o desgaste devido à grande manipulação dos tecidos atualmente estudados e a pouca oferta ao longo dos anos.

- A preocupação que temos é em repor o material já desgastado, que foi se deteriorando pelo uso dos alunos e pela necessidade que a gente tem de adequar nossas estruturas às novas formas do aluno entender a anatomia - comenta Veiga, que também é professor de histologia no Departamento.

A doação pode ser feita de qualquer lugar do Estado, basta seguir os procedimentos legais (veja acima). Ainda, segundo ele, a doação de corpos é semelhante à doação de órgãos. Não basta a pessoa querer e fazer o cadastro, a família precisa estar ciente e também autorizar. Afinal, se não existe um consenso entre os membros da família, o Departamento não será avisado do óbito e, com isso, não haverá doação.

- É responsabilidade da família transportar o corpo até a universidade. O curioso é que as pessoas que nos consultam sobre a possibilidade de doação de corpos tem o mesmo perfil daquela primeira senhora que nos procurou, ou porque que tem um filho que estudou aqui, ou por alguém que foi bem atendido no Husm. Então, por isso, gostariam de contribuir de alguma maneira para a formação dos futuros profissionais, em um nobre gesto em retribuição. Admiro muito essa mobilização de indivíduos que se desprendem dos seus entes queridos em nome da ciência - comenta Veiga.

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Foto: Gabriel Haesbaert (Diário)/Professores do Departamento de Morfologia da UFSM Marcelo Leite da Veiga e Carlos Eduardo Seyfert

FUTURA DOADORA

Laura Betina Lopes Pinheiro, 22 anos, natural de Três Passos, é estudante do quinto semestre de Odontologia na UFSM e, no início deste ano, decidiu encaminhar a documentação para se cadastrar no Programa de Doação Voluntária de Corpos da instituição. A decisão surgiu quando ela estava cursando a disciplina de anatomia aplicada à Odontologia, no segundo semestre do curso. 

- Nós, enquanto alunos, temos uma dificuldade grande de encontrar peças novas nos laboratórios, o que dificulta o aprendizado. Pensando assim, acho que nada mais justo do que eu doar meu corpo, uma vez que também usei corpos de outras pessoas para minha formação. O apoio da família e uma conversa clara são fundamentais, uma vez que, apesar do termo assinado em vida, quem decide realmente o que fazer é a família - conta Laura.

CONHECIMENTO REFORÇADO

  • O Departamento de Morfologia atende mais de 4 mil estudantes da UFSM, ligados a centros que estudam o corpo humano. Confira:
  • Centro de Saúde
  • Centro de Ciências Rurais
  • Centro de Ciências Naturais e Exatas
  • Centro de Educação Física e Desporto
  • Colégio Politécnico
  • Centro de Artes e Letras 

COMO SE TORNAR UM DOADOR

  • É preciso preencher três vias da declaração e testemunho de doação voluntária de corpo para estudo de anatomia
  • Três pessoas assinam o documento e é preciso reconhecer firma em cartório. Uma via fica no Departamento de Morfologia da UFSM, prédio 19, e as outras duas vias com o doador e a família
  • Quando a pessoa falecer, a família poderá fazer o velório, avisar o setor e fazer o transporte do corpo
  • Se for a vontade da pessoa, a doação de órgãos pode ser feita antes da doação do corpo ao Departamento
  • A pessoa deve ter mais de 18 anos. No caso de menores, deve haver o consentimento dos pais. Não há remuneração para que seja feita a doação
  • Quem tiver interesse pode imprimir o documento pelo site: www.ufsm.com.br/morfologia ou buscá-lo no setor de morfologia no prédio 19, do Campus no Bairro Camobi

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