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Primeiro mês de prevenção à Covid-19 permitiu preparar hospitais de Santa Maria

Dandara Flores Aranguiz e Natália Müller Poll

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Foto: Divulgação (Assessoria de Imprensa do Husm)

Um mês após as primeiras medidas e ações de contenção do avanço da epidemia do novo coronavírus serem tomadas no município e no Estado, muita coisa mudou. Aos poucos, algumas atividades estão sendo retomadas, com todo o cuidado necessário frente a um inimigo invisível, responsável pelo colapso dos serviços de saúde de muitos países.

O isolamento social, tido para alguns como exagero, foi fundamental para que a rede hospitalar municipal, principalmente a pública, pudesse ser organizada e estruturada, na visão das autoridades e gestores da área da saúde.

Santa Maria está há três dias sem registrar novos casos de coronavírus

- Temos um baixo número de casos, e isso foi a partir do engajamento da população nas medidas iniciais, que nos permitiu controle. Nosso cenário é bem positivo por todos estarem organizados. Poder público, saúde, empresários, população, transporte, farmácias, mercados, funerárias, hospitais, todo mundo está falando a mesma coisa - avalia o médico infectologista Fabio Lopes Pedro.

Nesse período, Santa Maria conseguiu implementar quase 60 leitos (intensivos, clínicos e semi-intensivos) para atendimento exclusivo de pacientes com suspeita ou confirmação de Covid-19 pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e ainda aguarda outros 50 leitos públicos previstos para abrirem no Hospital Regional, que serão 100% Covid-19.

- Considerando todas as estatísticas e que há um mês nós não tínhamos sequer os nossos leitos organizados e os insumos providenciados, esse mês de isolamento foi fundamental. Agora nós temos estrutura, então muda o cenário. Antes nós não tínhamos nada, mas agora estamos em uma nova fase e isso permite ao gestor a retomada gradativa das atividades - comenta Elaine Resener, superintendente do Hospital Universitário de Santa Maria (Husm).

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No complexo público, foram instalados cinco leitos obstétricos, 16 pediátricos (10 de UTI e seis semi-intensivos) e 20 adultos (10 de UTI e 10 semi-intensivos) para pacientes com suspeita ou confirmação de Covid-19.

RETOMADA
Para o prefeito Jorge Pozzobom (PSDB), a retomada das atividades adotadas nos últimos dias só foi possível graças à adesão ao isolamento e organização do sistema de saúde:

- Tenho a absoluta certeza que a ausência de mortes em Santa Maria e um número de casos, em tese, baixo, é resultado do isolamento que a gente fez. Estamos vivendo, por enquanto, uma certa tranquilidade, com a responsabilidade das medidas que nós tomamos. Está faltando agora, e muito, a conscientização das pessoas de que estamos tratando de um vírus que mata.

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Para o presidente da Sociedade Rio-grandense de Infectologia, o médico Alexandre Schwarzbold, além das medidas de orientação à população e do controle, o isolamento e a flexibilização precisam estar acompanhados de testagem massiva e acompanhamento da Vigilância.

- A partir do momento que você flexibiliza, a velocidade de transmissão vai crescer. E aí você precisa de um sistema de saúde bem preparado. O cenário aqui é tranquilo no sentido de que o sistema dá conta se tiver cinco, 10 ou 20 casos a mais. Agora, uma curva exponencial, não saberemos - afirma.

O infectologista alerta, ainda, para o fato de que a população terá de conviver com o vírus da Covid-19 nos próximos anos.

- Esse é um vírus que, provavelmente, vai ser como o da gripe se conseguirmos vacina. Ele vai estar no nosso meio e todo ano vamos ter que nos proteger. Não podemos achar que terminou o período de isolamento e acabou. Provavelmente, como um estudo de Harvard mostrou, talvez tenhamos que fazer isolamentos intermitentes - conclui o médico. 

DIRETOR DO HOSPITAL ALCIDES BRUM DIZ QUE SITUAÇÃO É TRANQUILA, MAS FAZ ALERTA
Desde 23 de março, o Hospital Alcides Brum atende exclusivamente pacientes confirmados ou suspeitos da Covid-19 que tenham plano de saúde ou particulares. Em apenas duas semanas, a estrutura foi montada e, hoje, conta com um Centro de Terapia Intensiva (CTI), um bloco cirúrgico, uma unidade de internação, um setor de imagem e emergência 24 horas.

Ao todo, estão disponíveis 45 leitos individuais. Desses, 22 podem ser transformados em quartos duplos para comportar 44 pacientes. O CTI tem 10 leitos, todos equipados com respiradores, com a possibilidade de ampliação, em caso de emergência.

Segundo o diretor técnico do hospital, Luiz Gustavo Thomé, este primeiro mês de isolamento foi positivo para que os casos não aumentassem já no início da pandemia.

- Agora, com a liberação das atividades e a retomada de contatos pessoais, acredito que vão aumentar os casos. Ainda mais com a entrada do inverno. Mas tranquilizo a população de que estamos com estrutura pronta e equipe qualificada para atendimento - ressalta.

O balanço deste mês de medidas restritivas no Alcides Brum foi de pouco fluxo nos atendimentos. Os números de internados oscilam entre confirmados e suspeitos do coronavírus.

- Não tivemos nenhum óbito, mas já tivemos de oito a 14 internações. Quatro foram de pacientes testando positivo, e o restante foram de casos suspeitos. Neste momento, temos três pacientes confirmados e dois suspeitos aguardando os resultados dos exames que, agora, levam de quatro a cinco dias - revela

EM RECUPERAÇÃO
Um dos pacientes internados com Covid-19 ficou entubado por mais de 10 dias, mas já está em um quarto e não necessita de respirador. O homem, que é de Canguçu, contraiu o vírus em viagem a bordo de um cruzeiro.

Thomé conta que, na noite de terça, o hospital recebeu sete pessoas com sintomas da doença e ressalta a importância dos cuidados com os grupos de risco.

CONFIRA A PALAVRA DE MÉDICOS, PREFEITO E GESTORES DA SAÚDE

"É só olhar as curvas para ver a eficiência das medidas. As coisas estão tão bem orientadas que o número de casos identificados está estacionado. A gente sabe que vai subir, mas as coisas não estão subindo rapidamente. A gente, como comunidade, parou porque não queremos que as pessoas morram. Nós não temos o direito e nem queremos escolher quem vai pra UTI ou quem não vai, ou quem vai viver ou vai morrer. Isso cabe ao Papai do Céu. A gente sabe que 15% dos infectados vai precisar ir para o hospital, e 5% vai precisar de UTI. Lá atrás, não tínhamos capacidade nenhuma para atendimento em CTI para Covid-19 em Santa Maria. O que tínhamos estava tudo ocupado com outras doenças. E temos que lembrar que essa é só mais uma doença. Se não temos testes, temos que orientar a população a se expor pouco, o que Portugal fez e deu certo. No Rio Grande do Sul, está dando mais certo que no resto do país. Todos os lugares que fizeram medidas restritivas mais precocemente estão indo melhor. Sabemos que vamos ter infecção, mas vamos devagar. Em Santa Maria, a parte política está sendo orientada pela parte técnica, o que eu acho muito bom. Pelo SUS, não tinha leitos nenhum. Hoje, temos no Husm, mais os semi-intensivos e o Regional abrindo, finalmente. O atendimento para o SUS, que é mais ou menos 80% de Santa Maria, saiu de zero para 60 leitos de internação. Estamos fazendo a lição de casa."
Jane Costa, médica infectologista e diretora clínica do Hospital de Caridade Dr. Astrogildo de Azevedo

"Como temos muita diversidade entre municípios, não só no Estado, como no país, temos números de casos documentados bem diferentes. Quando a gente tem casos pequenos e pouco crescimento, talvez seja o momento possível para uma flexibilização. Só que não temos esse dado correto para fazer isso agora. Só teríamos certeza se pudéssemos fazer uma testagem massiva, algo que não tivemos em todo o país. O isolamento e a flexibilização têm que ser muito bem acompanhados _ mais do que com as medidas corretas do município de orientação à população, uso de máscara e todo controle _ de testagem massiva e acompanhamento de vigilância. A partir do momento que você flexibiliza, a velocidade de transmissão vai crescer. E aí você precisa de um sistema de saúde bem preparado. O cenário aqui é tranquilo no sentido de que o sistema dá conta se tiver cinco, 10 ou 20 casos a mais. Agora, uma curva exponencial, não saberemos. A transmissão é relativamente controlada. Mas tem questões, com disponibilidade de leitos, que são decisões estaduais. Esse comprometimento que o Estado tem em relação à tomada de medidas graduais também tem que se dar na medida de viabilizar leitos no Interior e em diferentes regiões. Há o olhar muito para Porto Alegre e Região Metropolitana, o que é compreensível, obviamente, mas muitas cidades como Santa Maria, Pelotas e Passo Fundo, recebem pessoas de muitos municípios. A sensação que se tem de controle é que é só usar máscara na rua que vamos controlar e ter casos isolados. Acho que vamos conviver com o vírus nos próximos anos enquanto não tivermos cobertura vacinal adequada e segura."
Alexandre Schwarzbold, médico infectologista, presidente da Sociedade Riograndense de Infectologia

"Considerando todas as estatísticas nacionais e internacionais, e que há um mês atrás não tínhamos sequer os nossos leitos organizados e os insumos providenciados, esse mês de isolamento foi fundamental, haja vista que conseguimos organizar a estrutura do Husm nesse período, as internações obstétricas, com cinco leitos isolados para gestantes que possam ter suspeita de Covid-19. E isso requer tratativas ente os profissionais, organização de escalas, isolamentos, tem que fazer algumas adaptações de áreas físicas. O mesmo aconteceu na ala pediátrica, que nós criamos com 10 leitos intensivos e seis semi-intensivos. E por fim, na ala de emergência, onde abrimos os 10 leitos de UTI adulto e 10 leitos semi-intensivos. Separamos isso tudo fisicamente da outra emergência que continua funcionando. e deu tempo de chegar os equipamentos que o Estado encaminhou. Esse mês foi vital, no sentido de evitar maior circulação do vírus e maior número de pacientes graves. Ninguém sabia exatamente quantos seriam e como eles chegariam. Hoje, estamos com essas áreas todas estruturadas, protocolos organizados. Tivemos, até hoje (quarta-feira), 20 internações. Ao mesmo tempo, as equipes dos outros hospitais se organizaram criando o fluxo de encaminhamento desses pacientes. E acredito que um saldo positivo desse período é a abertura do Hospital Regional. Acho que a população de Santa Maria contribuiu muito. A retomada das atividades sociais e econômicas precisa ser progressiva. Agora nós temos estrutura. Então, muda o cenário."
Elaine Resener, superintendente do Hospital Universitário de Santa Maria (Husm)

"As medidas de prevenção foram corretas, e a flexibilização tem sido feita com adequações certas. Eu sou a favor dessa retomada das atividades. Temos um baixo número de casos, e isso foi a partir do engajamento da população nas medidas iniciais, que nos permitiu controle. Não temos certeza do futuro, porque o número tem que crescer. Inclusive, não podemos fazer uma contenção tão rígida, porque passaríamos o ano inteiro assim. Por isso, a retomada de atividades, para que as pessoas possam fazer seus afazeres, pagar suas contas, consultar com seus médicos. O número de casos foi baixo, muito bom para todos nós, e nos permitiu tomar essa decisão de retomada com mais segurança. Nosso cenário é bem positivo por todos estarem organizados, poder público, saúde, empresários, população, transporte, farmácias, mercados, funerárias, hospitais, todo mundo está falando a mesma coisa. Os hospitais privados estavam preparados desde o começo, os públicos, não. Faltava definição de fluxos e a abertura do Hospital Regional, que é imprescindível que se dê ainda em abril. Aí, teremos mais liberdade nas ações do dia a dia para atender mais pacientes, que eventualmente vão adoecer."
Fabio Lopes Pedro, médico infectologista

"A gente dividiu o planejamento estratégico em três fases. A primeira foi a contenção. E eu tenho a absoluta certeza que a ausência de mortes em Santa Maria e um número, em tese, baixo, são resultados do isolamento que a gente fez. Não me arrependo uma vírgula de todas as decisões que tomamos, porque tiveram respaldo dos médicos. Com diálogo com as entidades conseguimos encaminhar todas as medidas. Está faltando agora, e muito, a conscientização das pessoas de que estamos tratando de um vírus que mata. Eu não tenho a menor dúvida que o resultado daquilo que a gente propôs até agora foi positivo e nos ajudaram a evitar o aumento de número de pessoas contaminadas. A primeira fase deu certo. Nos deu tempo de nos organizarmos para a segunda fase, na questão dos leitos. Saímos do zero e estamos indo para 70 leitos SUS, que não tínhamos. A terceira fase, da retomada econômica, a gente só podia fazer se tivesse a garantia dessa segunda fase, que hoje nós temos. Estamos vivendo, por enquanto, uma certa tranquilidade, com a responsabilidade das medidas que nós tomamos." 
Jorge Pozzobom (PSDB), prefeito de Santa Maria

"O mês de isolamento foi crucial para conter o aumento da curva de casos positivos. Deu tempo para as unidades de saúde prepararem equipamentos e equipes para receber os pacientes. A UPA está pronta e bem organizada para receber os pacientes com coronavírus. Nós nos dividimos com o PA do Patronado, que nos envia pacientes com sintomas da Covid-19 e nós enviamos para eles, pacientes com outros sintomas. Tudo para garantir que ninguém entre em contato com o vírus, caso chegue algum paciente positivo aqui. As pessoas têm que entender que a UPA funciona como uma sala de emergência para o coronavírus. A gente tem estrutura para receber os pacientes e logo após, encaminhá-los para os hospitais que tem estrutura com leitos de UTI por exemplo. Na UPA conseguimos entubar apenas dois pacientes e por até 24 horas apenas. Por isso estamos com dois internados, porque eles não necessitaram de leitos de UTI, estão em leitos normais. Precisamos de leitos de retaguarda e aí entra a importância do Hospital Regional. Nós já contamos com o auxílio do Hospital São Francisco, que realiza tomografia pra gente, com horário ampliado de funcionamento desde que a pandemia iniciou. Todos os casos suspeitos que chegam aqui, são coletados material para exame. Sobre a Casa de Saúde, ela ainda não está atendendo pacientes do coronavírus, mas já estamos preparados para quando houver a necessidade."
Guilherme Weber, médico infectologista da Unidade de Pronto-Atendimento (UPA) e Casa de Saúde

"Nós temos, hoje, 45 leitos individuais. 22 deles podem ser transformados em quartos duplos para comportar 44 pacientes. O CTI tem 10 leitos, todos equipados com respiradores, com a possibilidade de ampliação, em caso de emergência. Este primeiro mês de isolamento foi positivo para que os casos não aumentassem já no início da pandemia. Agora, com a liberação das atividades e a retomada de contatos pessoais, acredito que vão aumentar os casos. Ainda mais com a entrada do inverno. Mas tranquilizo a população de que estamos com estrutura pronta e equipe qualificada para atendimento. O balanço deste mês de medidas restritivas no Alcides Brum foi de pouco fluxo nos atendimentos. Não tivemos nenhum óbito, mas já tivemos de oito a 14 internações. Quatro foram de pacientes testando positivo, e o restante foram de casos suspeitos. Neste momento, temos três pacientes confirmados e dois suspeitos aguardando os resultados dos exames que, agora, levam de quatro a cinco dias. Um dos pacientes internados com Covid-19, no nosso hospital, ficou entubado por mais de 10 dias. Agora ele está em um quarto se recuperando e sem a necessidade de respirador. Este caso é do homem, da cidade de Canguçu, que contraiu o vírus viajando em um cruzeiro. Na noite de ontem (terça-feira), o hospital recebeu sete pessoas com sintomas da doença. Por isso, eu reforço a importância dos cuidados essenciais, principalmente com os grupos de risco. Nós temos estrutura pronta para atender casos mais graves, mas os cuidados precisam continuar para evitar o aumento da doença. No período de 30 dias, o Hospital Covid-19, que é como chamamos o Alcides Brum, atendeu 177 pacientes na emergência. Tivemos 27 internações no total. A ocupação da UTI ficou entre 20 e 30 % e a ocupação da unidade clínica, entre 15 e 30%. Temos 21 médicos prestando atendimento para coronavírus e cerca de 100 funcionários envolvidos nos cuidados com a doença, incluindo profissionais da enfermagem, técnicos de enfermagem, escriturárias, higienização e portaria."
Luiz Gustavo Thomé, diretor técnico do Hospital de Caridade Dr. Astrogildo Azevedo e do Hospital Alcides Brum

"Sobre este mês de isolamento, posso dizer que foi muito importante para a organização do Hospital São Francisco na criação de um comitê de crise. Equipes foram treinadas, fluxos restabelecidos e precauções ainda maiores foram tomadas para proteção dos nossos profissionais e pacientes. Conforme organização dos gestores do hospital, com apoio da empresa que nos presta consultoria, ficou estabelecido que o Hospital São Francisco de Assis se tornaria uma referência para receber, nos leitos de enfermaria, UTI e bloco cirúrgico, outras patologias que não a Covid-19. Caso o sistema se esgote, planos de gerência de crise foram feitos, caso o cenário necessite ser ajustado. Mundialmente, existe a falta de equipamentos de proteção individual. Nós enfrentamos esta dificuldade, assim como os outros estabelecimentos."
Ivana Cassol De Bortoli, médica infectologista do Hospital São Francisco de Assis

*Colaborou Leonardo Catto

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