colunistas do impresso

PLURAL: os textos de Juliana Petermann e Eni Celidonio

Esperança em 12 meses
Juliana Petermann 
Professora universitária

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Chegou o momento de abraçar a agenda nova e escrever nela todo o tipo de esperança possível. Aliás, foi essa que nos trouxe até aqui. Acreditar que a pandemia terá fim. Acreditar que esse governo terá fim. E depositar em 2022 o que não pudemos fazer em 2021: terceira dose para todo mundo e voto na urna. E acreditar. Mais um pouquinho.

DE JANEIRO A JULHO

O janeiro de 2021 começou com dose de esperança: num domingo de temperatura amena para o quente do verão, assisti à enfermeira Mônica Calazans na TV. A primeira brasileira a receber a vacina. Mas com ritmo lento de imunização, fevereiro chegou sem samba, sem frevo, sem axé. Tanto em 2020, quanto em 2021, foram as águas de março que nos trouxeram um banho de realidade. Foi em março que entramos em isolamento social pela primeira vez e, depois, no março seguinte foi novamente necessário. 

Gigantes que somos enquanto país, nos movimentamos tão mal que encalhamos tal qual o navio no Canal de Suez. Em abril, fomos vergonha internacional: fizemos feio na Cúpula de Líderes sobre o Clima. E quem esperava algo diferente? Em maio, mês das mães e com a vacinação ainda a passos lentos, escrevi a esperança em uma carta para o meu filho. Falei sobre o mundo lá fora. Nascido em fevereiro de 2020, ele ainda não conhecia mais que um punhado de pessoas. Em junho, embora o frio do inverno tenha chegado, duas coisas me aqueceram o coração: a minha vez na fila da vacina chegou e vi o meu Brasil despertar um pouquinho e ir às ruas contra o governo federal e em defesa da vacinação. Mas, no mesmo dia, chegamos à triste marca de 500 mil mortos por Covid e, de tristeza, nossa esperança se foi, mais uma vez.

DE JULHO A DEZEMBRO

Mas, em julho, a esperança voltou de skate e ao som de Baile de Favela. Chorei com Rebeca e com Rayssa e cheguei recarregada a agosto, quando completei meus 40 anos. Em setembro, a pobre da esperança não teve uma vida fácil. Um verde amarelo estranho ocupou as ruas junto a ameaças golpistas. E, em outubro, ainda que a esperança não tenha se acabado, a CPI da Pandemia acabou-se. O final já era esperado: fomos abandonados à nossa própria sorte. Ou pior. Tinham um plano para acabar com a gente. Em novembro, choramos com Gabriel, um menino que nunca teve uma árvore de Natal e que encontrou uma no lixão. E eu, que falava em esperança, já nem sei mais o que dizer e ainda falta relembrar o dezembro. Mas no último fato da minha retrospectiva, vejo Nathan Paulin, equilibrado em um slackline, atravessando 500 metros entre o Morro da Babilônia e o Morro da Urca. E lá vejo também ela: a esperança equilibrista, que dança na corda bamba de sombrinha. E que me lembra que temos que continuar.

Natal
Eni Celidonio
Professora universitária

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Vocês estão sabendo que eu viajei agora para os "estates", né? Aproveitei um voucher da última viagem, que deu chabú na ida e na volta, para conhecer meu primeiro sobrinho bisneto. Mas não vou falar da viagem, podem ficar tranquilos. Vou falar de Natal.

Eu venho de uma família que leva o Natal e o Ano Novo muito a sério. Minha casa no Natal era uma festa, sempre teve árvore de Natal na sala, sem lareira, porque morávamos no Rio. A casa tinha uma varanda no segundo andar, no quarto dos meus pais, e era lá que meu pai colocava luzes, uma eletrola Philco com discos natalinos dos Canarinhos de Petrópolis (será que alguém já ouviu ou conhece?), e Papai Noel e um coral de três crianças que eram como uns enfeites que, ao serem ligados, ficavam lá mostrando ao mundo o espírito de Natal daquela família.

Essa lembrança de Natal que eu tenho remonta ao início dos anos cinquenta. Papai foi trabalhar na Delegacia do Tesouro Brasileiro em Manhattan e levou a família com ele. Eu devia ter um ano e meio, e passei meu primeiro Natal em meio a brinquedos que nem tenho mais, só em fotografias. Sabem como é brasileiro morando "na América" na década de cinquenta? Pois eu conto. Era uma época em que quase ninguém viajava para fora do país, fomos e voltamos de navio, sei lá quanto tempo para ir e quinze dias pra voltar. Sim, minha mãe viajou para o desconhecido com uma filha de pouco mais de um ano, Só pode ser louca, diziam na época. Não sei por que diziam isso, porque eu saí de Copacabana pra Bagé com um bebê de quatro meses e estou aqui contando essa história para vocês. Eu hein...

Enfim... Não tenho muita lembrança desse primeiro Natal, mas depois lembro dos bonecos de neve que meu irmão fazia com os colegas e de aprender a patinar no gelo aos cinco ou seis anos. Meu pai era um grande instrutor! Tacava os patins no nosso pé, botava a gente de pé e dava um empurrão ordenando: "Patina!", e é claro que eu caía de cara no gelo, mas foi indo e aprendi e é uma delícia! Eu lembro de ir ao Rockfeller Center patinar no gelo com papai e de ficar horas namorando a maior árvore de Natal que eu jamais havia visto, e lembro de vaticinar: eu tenho que voltar aqui para ver essa árvore um dia.

Pois senhores, voltei muitos anos depois com meus filhos e passei toda a viagem fazendo apologia à maior árvore de Natal que jamais existiu na face da terra. Pois bem, chegamos em Manhattan, atravessamos a 49 pela Quinta Avenida e, já quase no Rockfeller Center, fiquei ansiosa para rever minha árvore preferida, monumental. E eis que olho e vejo aquela árvore linda, imponente, mas muito menor do que eu me lembrava. Como assim? Cortaram a árvore? O que aconteceu? Hoje eu entendo que eu era uma criança olhando aquele monumento e, agora,

 eu já estava com meus cinquenta e tantos anos, eu era outra e o modo de ver era outro. E é exatamente isso que eu acredito que falte para nós hoje: esse olhar infantil, de deslumbramento às coisas simples, porque adulto realmente é um troço muito chato! Mas o Natal é um deslumbre!

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