distanciamento controlado

O que funcionou e o que ainda gera controvérsias no sistema de bandeiras

18.398

Entre amarelo, laranja, vermelho ou preto, o mapa do Rio Grande do Sul muda e têm sido levantadas bandeiras que ditam as normas que cada setor econômico deve seguir. Assim tem sido desde março, quando a cada semana, as regiões permanecem ou ganham uma nova cor. De forma bem resumida, esse é o Distanciamento Controlado, modelo criado pelo governo estadual para frear o número de infectados pelo novo coronavíus, já que barrar totalmente o contágio seria inevitável, e o "fique em casa" já causava discordâncias. 

Santa Maria tem mais quatro vítimas e chega a 150 mortes por Covid-19

Apesar de o modelo ser uma tentativa de conciliação entre saúde e economia, há divergências que seguiram em debate e, posteriormente, levaram a flexibilizações. O modelo completa 35 semanas na sexta-feira, dia em que a cor da primeira bandeira de 2021 será anunciada. A pergunta que muitos fazem, desde maio, quando foi divulgado, é: o modelo é eficiente? 

data-filename="retriever" style="width: 100%;">Foto: Renan Mattos (Diário)
No final de abril, comércio estava fechado na cidade. O Distanciamento Controlado ainda não existia

EM SANTA MARIA
Em enquete feita no Instagram do Diário, 1.522 (67%) seguidores disseram que não. Para especialistas, há pontos que funcionaram e outros que acabaram sem surtir efeitos. Na análise do médico epidemiologista Marcos Lobato, o Distanciamento Controlado teve sucesso, ainda em sua totalidade, na atenuação dos dados referentes à Covid-19. 

- Se pegarmos as projeções, sem o Distanciamento Controlado, ele funcionou. Nós projetamos uma quantidade de casos ainda maior do que se tem - argumenta Lobato, que também coordena o Centro de Referência Municipal de Covid-19. 

Vacina contra Covid-19 que tem testes na UFSM deve ser certificada em janeiro

O estatístico do Observatório de Informações em Saúde da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Luis Felipe Dias Lopes, trabalha com projeções desde o começo da pandemia. Diferentemente do médico, ele é mais enfático:

- Acho que não funcionou. O governo e a prefeitura tiveram boas iniciativas. O pessoal cansou, e o vírus está muito mais ativo. Tem muita gente assintomática e, por isso, a transmissão é maior. A exposição é um relaxamento. 

Lobato faz seu próprio contraponto ao considerar duas linhas: a limitação e a flexibilização. Apesar de protocolos que regem os setores da economia, há casos que não podem ser ditados por regulamentações do município ou do Estado. Isso gera, como defendeu Lopes, descumprimento de regras.

- O distanciamento não é cumprido quando pessoas furam o limite. Não é falha no sistema, mas ele não dá conta de reuniões de muitas pessoas em uma casa - exemplifica Lobato.

Feriadão de Ano Novo muda horários de comércio, bancos, saúde e coleta de lixo

O outro lado que diminuiu a eficiência do Distanciamento Controlado, para o epidemiologista é a flexibilidade. O médico encara que houve melhora nos indicadores de leitos disponíveis e casos ativos quando foram necessárias medidas mais restritivas. Do contrário, quanto mais leves as restrições, pioram os indicadores.

Os protocolos da bandeira vermelha foram flexibilizados no último mês. Foi quando Santa Maria atingiu o pior momento desde o começo da pandemia, e o total de casos ativos atingiu o número mais alto. Isso significa que a cidade teve a maior quantidade de pessoas infectadas e transmissoras do vírus, desde março.

Mesmo que o Estado tenha suspendido comemorações públicas das festas de fim de ano, o cenário esperado pós-Natal e Ano Novo não é animador. 

- No verão, estaremos em outro pico. Com as férias, as pessoas vão para a praia, onde vão se contaminar. Isso repercute em novos casos - diz Lopes.

O governo estadual, em nota, destaca o ineditismo do modelo, que foi reproduzido em outros sete estados. A avaliação é que o RS pôde "manter por maior tempo as atividades econômicas funcionando" e apresentar dados de óbitos menores que outros locais. 

UFSM mantém atividades presenciais suspensas até 31 de janeiro

data-filename="retriever" style="width: 100%;">Foto: Renan Mattos (Diário)
Em dezembro, o comércio já era condicionado aos protocolos da bandeira vermelha em Santa Maria

NOVO ANO
Para 2021, o modelo deve ser mantido. A partir do começo da vacinação - sem data definida -, o Estado vai avaliar adaptações.

Para o prefeito Jorge Pozzobom (PSDB) o Distanciamento é confiável, apesar de ressalvas quanto às proibições de bufês e esportes ao ar livre, por exemplo.

Outra discussão é sobre os horários do comércio. O prefeito assinala que, quando houve diminuição, a circulação de pessoas não acompanhou a redução dos horários. Na análise de Pozzobom, as pessoas cansaram das restrições, o que prejudica o cenário.

- Confio no modelo, discordo de questões pontuais. Sei que foi elaborado por pessoas capacitadas - avalia.

VÍDEO: prêmio de R$ 300 milhões leva santa-marienses a apostar na Mega da Virada

COMO FUNCIONA
As 30 regiões do Rio Grande do Sul foram redivididas (somente para a aplicação de bandeiras) em 21 outras para que cada uma tenha hospitais de referência com leitos de UTI

  • O Estado estabeleceu 11 indicadores que medem a propagação do coronavírus e capacidade de atendimento nos hospitais
  • A partir da média de classificação dos indicadores, é feita a classificação das regiões com a bandeira de risco
  • A classificação pode ser amarela, laranja, vermelha e preta. A amarela é a de risco mais baixo, enquanto a preta de alerta máximo
  • Cada bandeira tem respectivos protocolos de funcionamento e ocupação para setores da economia. Quanto mais grave a classificação da bandeira, mais restrições 
  • Desde a 7ª semana, regiões e municípios podem enviar um recurso para reclassificação, que pode ser aceito ou negado pelo governo estadual
  • Desde a 13ª semana, as regiões podem criar protocolos próprios com aval do governo estadual. Os protocolos podem ser menos rígidos que a bandeira vigente, mas apenas igual a bandeira imediatamente inferior Na prática, uma região que está em bandeira vermelha pode adotar regras da bandeira laranja
  • Cidades que não tiveram novas hospitalizações por Covid-19 ou novos casos nos 14 dias antes da classificação podem adotar protocolos menos rígidos. Essa regra é chamada de 0-0 (zero mortes e zero novos casos). Nestes casos, municípios vizinhos de Santa Maria, mesmo em bandeira vermelha, puderam funcionar com regras da laranja

O entrave da área da saúde com a economia deve seguir em 2021
O comércio é um dos principais setores que tem protocolos específicos no modelo de Distanciamento Controlado. Horários de funcionamento foram debatidos e alterados desde o começo do modelo. Ainda assim, a avaliação do setor, no final do ano, não é totalmente positiva.

O presidente da Câmara de Comércio, Indústria e Serviços de Santa Maria (Cacism), Luiz Fernando Pacheco, defende que as bandeiras foram ineficazes. Para ele, exemplo disso é o momento crítico que se apresenta em dezembro.

- Os casos nunca estiveram tão altos agora. Contra números, não se discute. A população está cansada, o vírus não vai embora - desabafa.

Ele ainda reitera que as restrições causam outro sofrimento, além do econômico, que é a perda de empregos.  

Vaquinha online arrecada dinheiro para remédio contra leucemia de R$ 87 mil

A presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL), Marli Rigo, relativiza a eficácia do modelo permeado de incertezas. 

- Ninguém tem certeza, uma crítica seria irresponsável. Acredito que houve boa intenção, mas o uso das bandeiras não se sabe se foi eficaz - opina.

Pacheco acredita, ainda, que o modelo a ser seguido é o isolamento de pessoas de risco, mas mantendo demais grupos da população em atividade.  

Angelo Arthur Dotto, proprietário de uma loja de artigos musicais no Centro, defende que ainda antes da criação do sistema, o comércio já havia cumprido um papel:

- Foram 30 dias fechados para saúde se equipar com leitos de UTI. E com a economia andando, não se vê aglomeração em loja nenhuma.

Ele crê que as medidas restritivas devam ser definidas pelo governo e cumpridas pela população para que os números da pandemia melhorem. Entretanto, o fechamento do comércio, segundo Dotto, não resolveria.

Setores reduziram serviço e seguem sem perspectiva positiva
Além das lojas, trabalhadores de setores como cultura, eventos, alimentação e hotelaria também tiveram restrições definidas pelas bandeiras. Alguns protocolos foram flexibilizados, mas seguem longe da normalidade.

Os restaurantes puderam operar em diferentes moldes. A principal mudança foi permitir o self-service em bandeira laranja. Mesmo com a proibição do serviço em bandeira vermelha, a avaliação é positiva para o presidente do Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares (SHRBS) de Santa Maria, João Carlos Provensi:

- O modelo cumpriu e manteve o setor funcionando e também não teve contaminação nos estabelecimentos.

Restaurantes, bares e lancherias não podem, porém, ter música ao vivo. Isso impediu que artistas desse nicho seguissem trabalhando. A cantora Anelise Varela concorda que as restrições devem existir, mas lamenta os impactos para a cultura: 

- Ajudou na saúde, mas a balança pesou diferente. A gente sempre fala que fomos os primeiros a parar e seremos o último a voltar.

O também músico João Vitor Menezes, que faz parte da Cia. Armazém de Teatro, acredita que há formatos que poderiam ter sido mais explorados para manter as atividades culturais. O exemplo que ele cita é o trenzinho do Viva o Natal, que percorreu bairros de Santa Maria em dezembro. Menezes também cobra fiscalização e conscientização da população:

- Se as pessoas tomassem consciência, teríamos mais atrações até na rua. 

Outro setor que protestou por alterações nos protocolos foi o de eventos. As casas de festas até tiveram algumas demandas atendidas, mas condicionadas ao retorno das aulas e somente em bandeiras amarela ou laranja. Luciani Avila Dorneles, proprietária da Stripullia Festas, aponta que o problema são aglomerações em outros setores.

- Há setores que seguem aglomerados, como transporte, mercados e barzinhos. A bandeira vermelha só bloqueou o setor de eventos, enquanto festas clandestinas seguem acontecendo - enfatiza Luciani.

A próxima rodada do Distanciamento Controlado tem o mapa preliminar divulgado pelo governo do Estado em 1º de janeiro, às 19h. Por enquanto, não há previsão de alterações nos protocolos de segurança

HISTÓRICO DE BANDEIRAS NA REGIÃO

  • 11 de maio - LARANJA
    Piores indicadores _ Internações de pacientes com Covid-19
  • 13 de junho  - VERMELHA
    Piores indicadores _ Internações de pacientes com Covid-19 e projeção de óbitos
  • 16 de junho -  LARANJA
    Chegou a ser vermelha, mas com a abertura de 7 novos leitos, foi modificada para laranja. Ainda não existia a possibilidade de recurso
  • 17 de julho - VERMELHA
    Piores indicadores _ Internações de pacientes com Covid-19, projeção de óbitos e leitos de UTI livres
    Região encaminha primeiro recurso para o governo estadual
  • 20 de julho - LARANJA
    Estado aceita recurso por considerar baixa a incidência de óbitos
  • 11 de setembro - VERMELHA
    Piores indicadores _ Internações de pacientes com Covid-19 e leitos de UTI livres
    Recurso foi encaminhado, mas negado pelo Estado
  • 18 de setembro LARANJA
    O que melhorou _ Número de internações de pacientes com Covid-19 e número de leitos de UTI livres
  • 25 de setembro - LARANJA
    Todas as regiões do Estado foram classificadas com risco médio
  • 2 de outubro - VERMELHA
    Santa Maria foi a única região do Estado com risco alto
    Piores indicadores _ Internações de pacientes com Covid-19 e leitos de UTI livres
    Não foi encaminhado recurso pela prefeitura
  • 9 de outubro - LARANJA
    O que melhorou _ Número de internações de pacientes com Covid-19 e número de leitos de UTI livres
  • 20 de novembro - VERMELHA 
    Piores indicadores _ Internações de pacientes com Covid-19 e leitos de UTI livres
    Pedido de recurso da região foi encaminhado e negado
  • 4 de dezembro - VERMELHA
    Piores indicadores _ Internações de pacientes com Covid-19 e número de leitos de UTI livres
    Pedido de recurso da região foi encaminhado e negado
  • 28 de dezembro - VERMELHA
    Piores indicadores _ Internações de pacientes com Covid-19 e leitos de UTI livres

Carregando matéria

Conteúdo exclusivo!

Somente assinantes podem visualizar este conteúdo

clique aqui para verificar os planos disponíveis

Já sou assinante

clique aqui para efetuar o login

VÍDEOS + FOTOS: 44 fatos que marcaram o 2020 de Santa Maria Anterior

VÍDEOS + FOTOS: 44 fatos que marcaram o 2020 de Santa Maria

Próximo

Decreto mantém ampliação do horário do comércio até 5 de janeiro

Geral