Comprar uma roupa, calçado, eletrônico ou qualquer outro produto está, literalmente, ao alcance dos dedos. A febre das compras online já tem um grande impacto, inclusive, em Santa Maria. Só os dois centros de distribuição das multinacionais Mercado Livre e Shopee, na Faixa Nova de Camobi, recebem de 30 mil a 50 mil produtos por dia, que são entregues por mais de uma centena de motoristas, em vans e carros. Os dados são extraoficiais, obtidos junto a entregadores que trabalham diariamente nessas duas empresas. Oficialmente, elas não divulgam informações. Se para o consumidor, é uma oportunidade de preços mais em conta e comodidade, por receber produtos em até um ou dois dias em casa, apenas por meio de cliques no celular ou computador, para o comércio local, isso provoca impactos negativos e desafios.
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Uma complexa operação logística, desconhecida por grande parte da população, transformou Santa Maria em um centro de distribuição regional para uma das maiores empresas de compras pela internet, a chinesa Shopee, movimentando até 30 mil encomendas por dia durante os picos de vendas. Fora dos períodos promocionais, que chegam a durar quase duas semanas, o volume diário se estabiliza em torno de 15 mil pacotes. A engrenagem é movida por uma rede de aproximadamente 200 motoristas autônomos que garantem que os produtos cheguem à porta dos consumidores.
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O fluxo de mercadorias tem como ponto de partida um grande centro de tratamento na Região Metropolitana, em Gravataí, de onde os pacotes são enviados para Santa Maria. Na cidade, o volume é dividido: metade é destinada às entregas locais e nos arredores, e a outra metade segue viagem para abastecer municípios como Uruguaiana, São Francisco de Assis, Sobradinho, Rosário do Sul e São Gabriel.
Segundo o Diário apurou, a centralização do sistema cria uma rota peculiar. Mesmo que um vendedor de Santa Maria utilize a plataforma para comercializar um produto, a encomenda entra no fluxo de distribuição local. Primeiro, ela precisa ser enviada para o centro de tratamento em Gravataí para depois retornar à cidade e, só então, ser encaminhada ao cliente final.
Na ponta final do processo, os entregadores são remunerados através de uma diária fixa. O modelo significa que o valor recebido não se altera com o número de pacotes ou a distância do roteiro de cada dia. José Oliveira Trindade, que trabalha há dois anos no ramo, relata uma rotina com uma carga que varia entre 90 e 115 pacotes e um percurso de aproximadamente 200 quilômetros.
– Eu trabalho em média 4 horas por dia, no máximo. A liberdade é um ponto positivo, com certeza – afirma Trindade, que realiza o trabalho com o auxílio da filha.
A renda mensal líquida, já descontados os custos com o veículo, fica entre R$ 4 mil e R$ 6 mil. Outro motorista, que também pediu para não ter o nome divulgado, confirma a faixa de rendimento.
– Em média, dá uns R$ 4 mil ou R$ 5 mil. Quem faz interior ganha mais – detalha.
Já no centro de distribuição do Mercado Livre, um dos entregadores comentou, extraoficialmente, que são recebidas e entregues de 18 mil a 21 mil mercadorias por dia aqui na cidade e entorno.
A reportagem buscou detalhar o volume total de entregas na cidade, mas tanto a Shopee quanto o Mercado Livre não quiseram conceder entrevista ou fornecer informações sobre suas operações.
A avaliação da CDL sobre os impactos e desafios do crescimento do comércio online
Para a presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL) de Santa Maria, Maria Elizabeth Flores, o crescimento exponencial das compras online representa tanto um desafio quanto uma oportunidade para o varejo da cidade. Segundo ela, a pandemia intensificou um movimento que já vinha ocorrendo, forçando o comércio local a se reinventar.
– O desafio foi intensificado com a pandemia. Com o comércio fechado ou com restrições de horário, os consumidores desenvolveram ainda mais a habilidade de comprar online. A oportunidade, por outro lado, foi para o comércio local focar em desenvolver e aprimorar as suas equipes e com isto dar um atendimento de excelência aos clientes – afirma a presidente.
Na visão da CDL, a principal vantagem competitiva da loja física está na experiência de compra.
– O comércio mudou, e esta interação com o cliente passou a ter uma importância maior. O cliente não busca só uma mercadoria, ele busca uma experiência interessante, poder ver o produto fisicamente, experimentá-lo, formar uma opinião sobre ele – detalha Maria Elizabeth.
Ela ressalta que o setor aprendeu a usar novas ferramentas para alcançar os consumidores, como as redes sociais, a realização de lives e as vendas por WhatsApp ou por sites próprios. A presidente da CDL também destaca os benefícios econômicos de fortalecer o comércio local.
– As pequenas e médias empresas contratam trabalhadores da sua cidade e, com isso, aumentam a renda local, o que vai refletir em outros negócios, pois a renda vai circular. Outro ponto importante a ser considerado é que parte do imposto das compras no comércio local fica na cidade, assim a prefeitura tem mais recursos para fazer frente às demandas – conclui Maria Elizabeth, que defende a necessidade de um estudo aprofundado sobre o impacto das vendas online na economia de Santa Maria.