28 médicos avisam que irão deixar a Santa Casa de São Gabriel por atrasos de salários e atendimento pode ficar comprometido

28 médicos avisam que irão deixar a Santa Casa de São Gabriel por atrasos de salários e atendimento pode ficar comprometido

Foto: Vitória Pariese (Diário/Arquivo)

Uma crise ameaça paralisar os atendimentos na Santa Casa de Caridade de São Gabriel. Com três meses de atraso nos salários, 28 dos cerca do mais de 45 médicos que atuam no hospital, segundo o Sindicato Médico da Região da Fronteira, entregaram um aviso que devem deixar a instituição em 27 de setembro. A situação pode inviabilizar o funcionamento de setores essenciais como pronto-socorro e UTIs. Em entrevista à reportagem, a administração do hospital afirma que busca "soluções emergenciais", enquanto o Sindicato Médico aponta má gestão e o prefeito do município, Lucas Menezes (União Brasil), garante que não permitirá a interrupção dos serviços.


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A instituição, que é referência para 11 municípios da região, vive um colapso financeiro que, conforme os profissionais, tem reflexos não apenas nos salários, mas também na falta de insumos básicos e na precarização das condições de trabalho. No entanto, a Santa Casa diz que nenhum salário dos demais profissionais está em atraso.


Cenário de dificuldades

Foto: Divulgação

De acordo com o diretor do Sindicato Médico da Região da Fronteira, Felipe Rodrigues Cunha, os problemas começaram em fevereiro, com pagamentos parciais e atrasos recorrentes. A situação se agravou nos últimos meses, e, conforme Cunha, os médicos receberam apenas um percentual de 40% do pagamento de junho.


– 90% dos médicos da Santa Casa nunca tiveram um contrato assinado com o hospital, trabalham há anos e de boca assim. Sem nenhuma formalização. Mas mesmo assim, nós comunicamos o hospital de que eles iriam paralisar, demos um prazo e na sexta-feira passada, esse prazo se esgotou e os médicos entregaram as suas cartas de aviso de que estão deixando de trabalhar na Santa Casa com um prazo de 15 dias estabelecido pelo Conselho Federal de Medicina – afirma Cunha.


Mesmo com o pagamento dos salários, os médicos não devem voltar, segundo o sindicato, a demanda é de que a gestão da Santa Casa passe a ser de competência do Executivo e que "assuma a responsabilidade e intervenha no hospital". 


– Qualquer solução que venha por parte da Santa Casa, a gente sabe que vai ser um paliativo, provavelmente eles vão tirar de algum outro setor para tentar apagar o incêndio agora. Foi feita uma auditoria no hospital, uma auditoria externa, que mostrou algo em torno de R$ 30 milhões em dívidas, R$ 28 a R$ 30 milhões em dívidas no hospital – ressalta o dirigente sindical. 


Em uma carta enviada à direção técnica do hospital, o diretor clínico, Ary Carnieletto Júnior, formalizou a gravidade da situação, alertando que, com a saída dos profissionais, "não haverá condições de manter escalas de atendimento" em especialidades como pediatria, UTIs, Cirurgia, Clínica Médica, Psiquiatria e Obstetrícia.


Como ficam os atendimentos a partir de 27 de setembro?

De acordo com o Sindicato Médico, a saída dos 28 profissionais, somada à decisão de outros médicos que permanecerão no hospital, mas suspenderão os serviços eletivos, deve inviabilizar o funcionamento regular da instituição a partir do dia 27. Cunha detalha o cenário de dificuldades com a medida:

  • Serviços que serão interrompidos: Consultas ambulatoriais, primeiras consultas de pacientes oncológicos e cirurgias eletivas (tanto gerais quanto oncológicas) serão suspensas. Pacientes novos terão que ser remanejados para outros hospitais da região.
  • Serviços que serão mantidos: Atendimentos de urgência e emergência e os tratamentos de pacientes que já estão em quimioterapia continuarão a ser realizados para não prejudicar quem já está em tratamento.


O que diz a Santa Casa

Ao Diário, o administrador do hospital, Dilnei Garate, reconheceu os atrasos com os honorários dos médicos, mas diferencia a situação dos salários dos demais funcionários, que, segundo ele, estão em dia. Ele afirma que a expectativa é quitar os débitos com esses profissionais antes do prazo de 27 de setembro, com recursos extraordinários que estão sendo buscados.


Para ele, a raiz da crise é o subfinanciamento ( leia mais abaixo) crônico do Sistema Único de Saúde (SUS).


– Muita gente sabe, mas pouca gente divulga, que é o sistema remuneratório do SUS, cuja tabela tem procedimentos que há mais de uma década não são reajustados. A inflação na área da saúde chega a ser três vezes superior à inflação oficial – explica Garate.


O administrador informa que 92% do faturamento do hospital depende do SUS e que, para cada R$ 100 gastos, a tabela remunera no máximo R$ 55. O balanço de 2024, conforme ele, apontou um déficit de R$ 14 milhões. Contudo, ele nega que a crise seja fruto de má gestão e afirma que a instituição está em um processo de revisão de todos os contratos para otimizar os recursos.


“Não vamos permitir que haja prejuízo”

Foto: Divulgação

O prefeito Lucas Menezes afirma que acompanha a situação de perto e que não permitirá a paralisação dos serviços.


– Nós não vamos permitir que haja qualquer prejuízo, qualquer problema, qualquer risco, qualquer paralisação em qualquer setor de ponta do hospital. Nós estamos falando de uma instituição que salva vidas – garante o chefe do Executivo.


Menezes revelou que uma auditoria contratada pela prefeitura apontou um "desequilíbrio profundo" nas contas do hospital, com as despesas "superando em muito as receitas", o que leva a um caminho de "insolvência técnica". De acordo com ele, várias alternativas estão sendo estudadas para sair da crise, mas não detalhou quais seriam. Questionado sobre uma possível intervenção municipal, o prefeito não descartou a medida, mas afirmou que espera que a gestão do hospital consiga reverter o quadro.


Até a publicação desta reportagem, nenhum serviço havia sido interrompido. No entanto, o Sindicato Médico da Fronteira reforça que as consultas e cirurgias eletivas, assim como novos atendimentos oncológicos, podem ser suspensos a partir do dia 27, caso não haja pagamento integral dos valores em atraso.


Oque é subfinanciamento do SUS?

De acordo com um estudo da Instituição Fiscal Independente (IFI), órgão ligado ao Senado Federal, publicada em julho deste ano, o Brasil possui um "crônico subfinanciamento" do Sistema Único de Saúde (SUS) quando comparado a países mais desenvolvidos. 


Segundo o levantamento, para que o país atingisse o patamar médio de gasto por habitante das nações da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), seria necessário elevar o investimento total em saúde dos atuais 9,1% para 19% do Produto Interno Bruto (PIB) — ou seja, mais que dobrar as despesas.


O estudo projeta as necessidades de financiamento do sistema de saúde brasileiro para os próximos 45 anos, levando em conta o envelhecimento da população e a incorporação de novas tecnologias. A conclusão é que, diante das atuais restrições orçamentárias, o país enfrentará um dilema.


A IFI aponta que, sem o deslocamento de recursos de outras áreas do orçamento, o resultado será a "deterioração dos padrões de acesso, qualidade e integralidade do SUS". O impacto social dessa precarização é direto, uma vez que, segundo o estudo, 76,5% da população brasileira depende exclusivamente do sistema público de saúde.


A distorção nos gastos

Um dos pontos centrais da análise é a forma como os recursos da saúde são distribuídos no Brasil. Embora o país destine uma parcela do PIB à saúde (9,8%) próxima à média da OCDE (9,2%), a divisão desses gastos revela uma grande distorção:

  • No Brasil: Apenas 45% dos recursos totais da saúde são destinados ao sistema público (SUS).
  • Média da OCDE: Em países com sistemas universais, a média de investimento público é de 76% do total.


Essa diferença, segundo a IFI, faz com que o gasto por habitante no Brasil seja três vezes menor que a média dos países da OCDE, o que explica as dificuldades enfrentadas por hospitais filantrópicos que dependem majoritariamente dos repasses da tabela do SUS, cujos valores, em muitos casos, não são reajustados há mais de uma década.



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