júri da kiss

'Incendiar uma boate cheia de gente é crime de homicídio doloso', sustenta Ministério Público

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Foto: Pedro Piegas (Diário)
Promotor David Medina da Silva iniciou a fala da acusação

Passada a fase de depoimento das testemunhas e interrogatório dos réus, começou o debate entre acusação e defesas. Essa é a última etapa do júri da Kiss antes da decisão dos jurados. A primeira parte, de duas horas e 30 minutos, é destinada ao Ministério Público e aos assistentes de acusação. No momento de maior impacto da argumentação, a promotoria exibiu um vídeo, resgatado do celular de uma vítima, que mostra a agonia das pessoas tentando sair da boate. Também foram reproduzidos áudios de ligações desesperadas aos órgãos de salvamento da cidade no momento do incêndio.

O promotor David Medina da Silva sustentou a denúncia por homicídio com dolo eventual (quando se assume o risco de matar). Segundo ele, os sócios da boate assumiram o risco de matar ao manter uma boate "em forma de labirinto" e com irregularidades. Já os integrantes da banda, conforme o MP, utilizaram um artefato pirotécnico que não era adequado para uso interno. Ao se dirigir diretamente aos sete jurados que compõem o Conselho de Sentença, David pediu:

- Precisamos falar para a sociedade que incendiar uma boate cheia de gente é crime de homicídio doloso, porque isso vai proteger nossos filhos e filhas. Eu não quero que o meu filho entre numa boate para que não saia mais. Precisamos falar para os donos de boate do Brasil inteiro cuidarem de seus frequentadores. As pessoas entram e precisam sair.

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O promotor refutou o argumento das defesas em dizer que trata-se de um acidente e que os réus não queriam que o incêndio ocorresse. Mesmo que não quisessem, não teriam feito nada para impedir, de acordo com o MP. 

- Quero dizer livremente, que não quero chamá-los de assassinos. Ninguém vai dizer que vocês queriam matar as pessoas. Mas qual cautela que vocês tomaram para não incendiar ninguém? Não estou chamando esses rapazes de serial killers. Mas se um serial killer mata 10, 20 pessoas... Na Kiss morreram 242 pessoas - enfatizou. 

David lembrou as penas por homicídio: o crime culposo vai de um a três anos de prisão; já por dolo, de seis a 20 anos. 

- Não é uma questão de vingança. As penas precisam ser proporcionais às ofensas. Qual das duas penas é mais proporcional ao que aconteceu? - questiona.

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Foto: Pedro Piegas (Diário)

FAMILIARES
Durante a fala do Ministério Público, os pais e os sobreviventes que acompanham o julgamento em plenário formaram um circulo, de mãos dadas, no centro da plateia. David falou da dor dos familiares e sobreviventes:

- Os réus estão falando de prisão. Mas eu duvido prisão pior que a de Kelen (sobrevivente, que teve 18% do corpo queimado e uma perna amputada) que precisa carregar a sua perna para cima e para baixo. É triste. É lamentável. E nós não queremos isso para ninguém - disse.

DOCUMENTO
O promotor exibiu em um telão um documento de licença de operação ambiental da Kiss, assinado por Ângela Callegaro (irmã de Elissandro Spohr, que cuidava da parte financeira da boate). Na licença, consta a proibição de uso de artefatos de fogo dentro da boate.  

- A tese dos réus é mais ou menos assim: 'eu não tenho culpa, a culpa é do sistema'. Essas pessoas não têm condições de assumir seu erro. É muito difícil assumir a morte de 242 pessoas. Quer negar, nega, mas não fica espalhando responsabilidades - argumenta. 

Enquanto imagens dos jovens mortos dentro da Kiss e no Centro Desportivo Municipal (CDM), onde aconteceu a identificação, são exibidas no telão, David cita, ainda, outras irregularidades: a lotação acima da capacidade na Kiss, extintores que não funcionaram, a falta de sinalização, que levou muitos jovens em direção aos banheiros, onde morreram "empilhados":

- Se tinha indicação de saída, por que tanta gente morreu empilhada num banheiro como moscas, seguindo o único pontinho de luz daquele lugar, pensando que poderia sair?

ASSISTÊNCIA DE ACUSAÇÃO
Após o promotor David, o advogado Pedro Barcellos, que representa a Associação dos Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria (AVTSM), falou aos jurados. Barcellos lembrou que muitos pais passam dificuldades, porque eram sustentados pelos filhos que morreram na tragédia. Também falou que alguns familiares acabaram se suicidando.

- A espuma, o Elissandro mandou botar. Luciano e Marcelo estão ligados ao começo do fogo. O Mauro, ficou provado ser proprietário - afirmou Barcellos. 

FUNÇÃO DOS RÉUS
Por fim, a promotora Lúcia Helena Callegari também argumentou sobre a relação de cada um dos réus com o incêndio, colocando para os jurados a posição de cada um no caso. Lúcia também exibiu um vídeo, do início do fogo na boate, para mostrar como o incêndio começou e as ações de quem estava no palco. Também sustentou que os músicos foram os primeiros a deixar a boate, sem avisar o público sobre o fogo. Ao exibir cartazes e revistas, a promotora diz que a Gurizada Fandangueira apresentava que os fogos eram "diferencial" da banda.

- E nunca se preocuparam em verificar se um extintor de incêndio funcionava - falou. 

A promotora também mostrou vídeos e áudios de pessoas gritando ao tentar sair da boate. O vídeo, resgatado de um celular de vítima, escancara a escuridão da boate e o desespero das pessoas sem conseguir encontrar a saída. O áudio, também desesperado, é de uma ligação de um dos jovens para Brigada Militar e Corpo de Bombeiros para informar sobre o incêndio. "Fogo na Kiss!", gritavam as pessoas. Alguns familiares precisaram deixar o plenário após passarem mal. 

COMANDAS
Lúcia também mostrou um trecho de um depoimento de outro processo, junto à Polícia Federal, de um funcionário da boate que trabalhava na entrada. Conforme o depoimento, havia orientação para que os seguranças não deixassem as pessoas saírem da Kiss sem pagar as comandas. O funcionário confirmou no depoimento que, na madrugada da tragédia, Elissandro Spohr teria feito ele segurar "um pouco" a porta e também "se plantou na porta" junto dele.

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