
Foto: Maria Júlia Corrêa (Diário)
O último feriadão de Páscoa e Tiradentes registrou números alarmantes na violência contra as mulheres no Rio Grande do Sul, com 10 feminicídios. Desse total, uma morte foi registrada na região em plena Sexta-Feira Santa (18): Juliana Proença Luiz, 47 anos, assassinada pelo ex-companheiro, que assumiu a autoria do crime, em São Gabriel.
O cenário da violência contras as mulheres é preocupante, e atinge também o Coração do Rio Grande. Nos últimos seis anos, sete mulheres foram vítimas de feminicídio, e outras 35 sobreviveram a tentativas de feminicídio em Santa Maria. Os dados são da Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher (Deam).
Outro dado alarmante na cidade: em 2024, 392 homens foram presos em ações policiais de combate à violência doméstica. Neste ano, até a última quinta-feira (24), 191 pessoas já foram parar atrás das grades pelo mesmo crime.
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Cenário de Santa Maria
A Delegacia da Mulher, localizada no centro de Santa Maria, recebe e registra denúncias, solicita medidas protetivas, transporta as vítimas para um local seguro, além de buscar os pertences das vítimas ou seus filhos em casa, caso seja necessário.
A Deam, coordenada desde 2019 pela delegada Elizabete Kaouru Shimomura, abrange a área de Santa Maria e São Martinho da Serra.

– A violência sofrida não se restringe somente à física, mas também à moral, psicológica, patrimonial e sexual – ressalta a delegada.
Dos sete feminicídios e 35 tentativas nos últimos seis anos, o ano de 2019 foi o que contabilizou o maior número de mortes: quatro. Três dessas mortes foram cometidas em março, o mês da mulher. A partir de então, desde 2020 para cá, esse indicador está em queda.
Além da redução, o trabalho em prender os agressores que cometem esse tipo de crime precisa ser ágil e eficiente. Como resultado, até o dia 24 de abril deste ano, 191 prisões (entre flagrantes e preventivas) foram realizadas tanto pela Deam quanto pela Delegacia de Polícia de Pronto Atendimento (DPPA) no âmbito da violência doméstica.
A que se deve esse resultado? A delegada reforça que o trabalho conjunto dos órgãos de segurança na cidade ajuda no combate à redução desses números:
– Atribuo isso à perfeita sincronia entre os órgãos de proteção. Em um primeiro momento, Polícia Civil, Brigada Militar, Ministério Público e Poder Judiciário. Temos uma relação muito estreita e sincronizada. Conseguimos individualizar as vítimas e identificar potenciais agressores.
Confira os números:
- 2019: 4 feminicídios e 4 tentativas
- 2020: 1 feminicídio e 5 tentativas
- 2021: 0 feminicídio e 3 tentativas
- 2022: 1 feminicídio e 9 tentativas
- 2023: 0 feminicídios e 2 tentativas
- 2024: 1 feminicídio e 7 tentativas
- 2025 (até o dia 24 de abril): 0 feminicídios e 5 tentativas
Total de crimes no período: 7 feminicídios e 35 tentativas
Prisões em decorrência da violência doméstica (feitas pela Deam e DPPA):
- 2024: 392 prisões
- 2025 (até 24 de abril): 191 prisões
Vítimas com mais acesso à informação
São constantes e, praticamente diárias, as ocorrências de prisões em decorrência de violência doméstica e demais procedimentos na delegacia. A delegada vê um lado positivo neste aspecto, pois significa que as vítimas estão mais conscientes, buscando ajuda e, principalmente, direitos.
– Vejo que as vítimas hoje possuem mais informações, não somente pelas redes sociais, mas também pelos meios de comunicação. Hoje elas sabem que podem buscar ajuda. Houve uma mudança de cultura nos últimos anos, tanto das vítimas quanto de quem as cerca, o que ajuda na conscientização – fala a delegada.
Além disso, Shimomura reforça que os órgãos de segurança estão atuantes, de forma intensa, no combate à violência doméstica. Saber que um agressor não ficou impune reforça a sensação de segurança por parte da vítima, facilitando o caminho até o pedido de ajuda:
– A confiança da vítima em todo o sistema que envolve todo o processo, desde a ocorrência até a medida protetiva, proteção, prisão dos agressores... isso reforça a sensação de proteção. É importante não olhar somente para os números de forma bruta, mas também reforçar esse movimento de procura, de conscientização, que tem se tornado cada vez mais forte.
Onde pedir ajuda em Santa Maria
Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher (Deam) de Santa Maria
Endereço da Deam: Rua Duque de Caxias, 1.159, Centro
Horário de funcionamento: de segunda a sexta, das 8h30min às 12h e 13h30min às 18h
Telefone: (55) 3222-9646 ou (55) 98423-2339
Endereço da DPPA: Avenida Nossa Senhora Medianeira, 91, Bairro Medianeira
Horário de funcionamento: 24 horas (inclusive finais de semana e feriados).
Telefone: (55) 3222-2858 ou por meio do 190
Quem são as sete vítimas
2019
Quelen de Medeiros da Rosa - 4 de março
A mulher de 30 anos foi morta a facadas e encontrada já sem vida na Rua Irmã Terezinha Werner, no Bairro Nova Santa Marta. De acordo com testemunhas, a vítima teria saído gritando por socorro de dentro de casa com ferimentos de golpe de facas na regiã o do peito e das costas. Pedro Silva de Melo, 56 anos, companheiro e suspeito pelo assassinato fugiu, levando a filha do casal. No dia 13 de março, foi preso após ser encontrado escondido em uma casa no interior de Jari e encaminhado à Pesm.
Fernanda Mariâne Debus Hoffmeister - 10 de março
Menos de uma semana depois, mais uma mulher foi morta na cidade naquele ano. A vítima, com 22 anos, foi encontrada morta dentro do apartamento onde morava com seu namorado, o principal suspeito pelo crime, no centro de Santa Maria. O homem de 20 anos teria fugido para São Vicente do Sul, onde cometeu suicídio. Leia mais aqui.
Tainara da Silva de Aquino - 9 de maio
A jovem de 25 anos foi morta com um tiro na cabeça no Bairro Nova Santa Marta, região oeste da cidade. O fato ocorreu dentro da casa da vítima, onde ela vivia com seus dois filhos, na época ainda crianças. O autor do disparo foi o ex-companheiro, na época com 24 anos, e pai dos filhos de Tainara, que fugiu após o crime. De acordo com matéria publicada pelo Diário, a vítima havia terminado o relacionamento com o homem antes de ser morta.
Denise Monfardini - 10 de novembro
A mulher de 33 anos foi morta por esganadura pelo próprio companheiro Alciomar Chaves Marques, 32, no Bairro Camobi. Após o crime, o homem cometeu suícidio. De acordo com matéria publicada na época pelo Diário, a irmã da vítima abordou uma viatura da Brigada Militat que fazia patrulhamento próximo do local. Ela informou que a irmã estava desaparecida. A viatura se deslocou à residência do casal. No local, policiais arrombaram uma porta e vasculharam a casa. Eles encontraram o homem morto em um cômodo, e Denise Monfardini em outro. Ela tinha marcas de esganadura.
2020
Andressa de Borba Agnes - 23 de março
A jovem de 26 anos foi morta com três tiros após uma discussão com o próprio irmão, que também ficou ferido. O fato ocorreu no Beco do Beijo, no Bairro Camobi. Conforme o boletim de ocorrência registrado no dia do crime, testemunhas informaram que os dois estariam na residência quando a vítima efetuou dois disparos de arma de fogo contra o irmão, que teria pegado o revólver e disparado contra Andressa. Ela foi atingida por três disparos: no peito e nos braços esquerdo e direito. O homem levou dois tiros, um no abdômen e outro nas costas.
2022
Luanne Garces da Silva - 9 de abril
A estudante de psicologia, na época com 27 anos, foi asfixiada e morta em via pública pelo próprio noivo, Anderson da Costa Ritzel, no Bairro Itararé,em Santa Maria. Como o autor confesso do crime foi enquadrado como inimputável pela Justiça, não foi levado a julgamento.
2024
Mariane de Souza Ravazi - 9 outubro
O último feminicídio consumado em Santa Maria ocorreu na manhã do dia 9 de outubro, quando a vítima de 40 anos foi morta a facadas pelo ex-companheiro no centro da cidade. A mulher, que tinha medida protetiva contra o agressor, estava sendo perseguida e entrou em um estabelecimento comercial para pedir ajuda, porém o homem invadiu o local e cometeu o crime. O autor dos golpes fugiu mas foi localizado em outro bairro da cidade, preso em flagrante e levado à Penitenciária Estadual de Santa Maria (Pesm).
Panorama estadual
Ao expandir a busca e olhar para o cenário estadual, a reportagem coletou dados do Indicador da Violência Contra a Mulher - Lei Maria da Penha, disponível no site da Secretaria de Segurança Pública (SSP). O período da pesquisa compreende 2019 até o primeiro trimestre deste ano. Ou seja, os dados referentes ao mês de abril, que registrou 10 mortes somente no feriadão de Páscoa, não foram disponibilizados.
Em 2019, o Estado fechou o período com 97 mulheres mortas, reduziu esse número nos dois anos consecutivos, mas voltou a registrar aumento em 2022, quando 111 feminicídios foram registrados. No primeiro trimestre de 2025, ocorreram 83 tentativas de feminicídio, enquanto 17 mulheres foram mortas no Estado. No ano passado, foram 24 mortes no mesmo período.
Confira na tabela abaixo os índices de feminicídio cometidos no Estado desde 2019:
Local | 2019 | 2020 | 2021 | 2022 | 2023 | 2024 | 1º tri de 2025 |
Rio Grande do Sul | 97 | 80 | 96 | 111 | 85 | 72 | 17 |
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