Prefeitura contrata empresa para mapeamento de plano de arborização de Santa Maria

Thais Immig e Vitória Sarturi

Moradora da Rua Mariano da Rocha, a aposentada Marta Helena Ribeiro, 70 anos, viu a quantidade de árvores diminuir com o passar do tempo em Santa Maria. A paisagem é bem diferente daquela encontrada há 50 anos, quando se mudou para um sobrado na região central da cidade. Dentro do pátio, encontra alternativas para a falta do verde nas ruas. Sem espaço para árvores de grande porte, ela cultiva um pé de mamão, alguns arbustos e flores.

Mas a paisagem poderá mudar no futuro, já que está no horizonte da prefeitura de Santa Maria  implementar um plano de arborização para a área urbana. Ao ser questionado sobre essa possibilidade, ela afirma ser uma espera de anos e até brinca que pode oferecer algumas mudas:

– Dava para se esconder debaixo das árvores, principalmente no verão. E, com o tempo, tudo saiu. Não sobrou quase nenhum pé. Sentimos falta, até os carros se abrigavam nas árvores quando estava quente. E o verde é muito lindo – relembra dona Marta.

Marta mora há 46 anos no centro da cidade

O anseio de dona Marta por uma cidade mais verde pode estar perto de se concretizar. Há décadas esquecido na gaveta, o Plano de Arborização começa a sair do papel. Conforme o secretário municipal de Meio Ambiente, Diego Rigon, uma empresa foi contratada – por meio de um ajustamento de conduta entre o Ministério Público e um empreendedor – para identificar todas as árvores da cidade, nas ruas e nos parques e fazer o georreferenciamento e a catalogação. Essa iniciativa é aguardada desde 2011, quando foi aprovado um plano pelo Conselho Municipal de Defesa do Meio Ambiente (Condema), mas nunca chegou a ser implementado de fato.

– As árvores vão ser identificadas, conforme a fisiologia delas. Se estão com doenças, se atrapalham a visão de placas e pedestres, se há problemas de raiz. Temos muitas mudas que foram plantadas na calçada e que não são adequadas, como as exóticas invasoras. Vamos ter a definição de todas as espécies que temos hoje – afirma a secretária adjunta do Meio Ambiente, Charlene Moro Stefanel.


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A partir desse estudo, serão definidas as diretrizes para implementação da arborização urbana. São elas que vão apontar as espécies compatíveis, o melhor espaçamento e o porte ideal para as árvores. Em ruas com grande tráfego de veículos e pedestres, por exemplo, é importante evitar espécies frutíferas em que as sementes podem ser escorregadias ou germinar em bocas de lobo, causando entupimentos. Em resumo, “não é só plantar”, conforme a secretária adjunta.

Imagens aéreas da cidade mostram a falta do verde nas ruasFoto: Vinícius Machado (Diário)

O mapeamento também vai identificar as ilhas de calor e os jardins de chuva, que são aquelas áreas suscetíveis a alagamentos. Por isso, o objetivo com o plano é, também, preparar a cidade para eventos climáticos, como as enchentes.

Ter um plano de arborização também é deixar a cidade preparada para eventos climáticos, como  cheia e inundação ou secas prolongadas. Com uma cidade arborizada, é justamente para mitigar esses impactos negativos das mudanças climáticas – afirma o secretário Diego Rigon.

Uma das espécies que pode ser utilizada é a sibipiruna

A previsão é que o mapeamento seja entregue até o final deste ano. Depois, há um prazo de seis meses para definir o plano. Finalizada essa etapa, as primeiras árvores serão plantadas. O plano em discussão agora, ainda conforme a secretaria, é um novo projeto – diferente daquele aprovado há 14 anos. Nesse processo, também estão previstas audiências públicas para apresentar e discutir o estudo com a população. 


O que é arborização? 

“A arborização é a presença de árvores no ambiente que os seres humanos habitam. Não só a presença das árvores, mas a relação dos seres humanos com ela, a poda, o plantio, a seleção de espécies, seleção de tipos diferenciados ou não, exóticas, nativas, todo esse manejo envolve a arborização, não é só o contexto da árvore em si, mas a relação com os seres humanos têm com esse ambiente arborizado, quer dizer, o ambiente com presença de árvores”
– define Renato Aquino Záquia, professor universitário e colaborador do Jardim Botânico. 


Plantas não são objetos, afirma especialista 

Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), com base no Censo Demográfico de 2022, revelam que 58 milhões de pessoas moram em locais sem arborização, ou seja, sem áreas verdes. Em sintonia com o levantamento, o professor universitário e colaborador do Jardim Botânico, Renato Aquino Záchia, afirma que a falta de árvores nas áreas urbanas não é um caso isolado de Santa Maria:

Em todas as cidades existe uma tendência de uma falta de orientação na arborização.É importante haver um plano de arborização porque as árvores podem ficar velhas, cair em cima das casas, danificar a rede elétrica, ainda mais agora no contexto das mudanças climáticas, com ventanias, vendavais, tempestades.

Renato tem ampla experiência na área de BotânicaFoto: Vitória Sarturi (Diário)

O especialista ressalta, também, que um projeto para arborizar a cidade não se resume às operações técnicas, de mapeamento ou plantio. É essencial envolver a população, para que compreenda as plantas como parte do ecossistema:

As pessoas enxergam as árvores como objetos. As plantas devem ser respeitadas como um ser vivo. Não é algo que pode ser transportado para lá e para cá. Mais do que um plano de arborização somente técnico, ele tem que ter uma perspectiva de envolvimento da população, para que entenda que faz parte do ecossistema. Ela não é o ser superior ao ecossistema. 


Como acontece a remoção das árvores? 

A Lei 9.605/1998 estabelece que danificar, destruir, lesar ou maltratar plantas de ornamentação, em área pública ou privada, é crime. Assim, toda retirada de árvores deve passar por avaliação do órgão competente. Em Santa Maria, a solicitação de corte, poda ou supressão é feita pelo sistema da Secretaria de Meio Ambiente. Após o cadastro, uma equipe vai até o local para análise. Além disso, a RGE tem autorização do governo do Estado para podas e supressões, desde que coloquem em risco a fiação elétrica. 

Na rua Vale Machado, são diversos pontos da calçada que registram o corte de árvoresFoto: Beto Albert (Diário)

O que acontece, muitas vezes, conforme a secretária adjunta Charlene Stefanel, é que as espécies plantadas não são adequadas a áreas urbanas e acabam colocando em risco a infraestrutura de calçadas, empreendimentos e residências:

– Tem esse apego (dos moradores com as árvores). Mas, muitas vezes, a espécie não é adequada e pode gerar um transtorno.

A diminuição do verde na cidade é sentida pelos moradores. Como alternativa, o aposentado Antônio Lima, 56 anos, conta que procura, cada vez mais, os parques.

– O verde faz muita falta, ainda mais com o aumento da poluição. Quanto mais verde, melhor. Eu vejo que os prédios tomaram conta. E pouca árvore. Por isso, sempre procuro o parque – afirma ele.

Antônio frequenta, principalmente, o Parque da Medianeira – o mais perto de casa


Caminhos para o verde e para a educação ambiental

Questionada sobre os desafios da implementação de um plano de arborização, a Secretaria do Meio Ambiente aponta para a educação ambiental. Conforme Charlene, é preciso investir em ações, como cursos e capacitações, para que os moradores entendam a importância das árvores na área urbana. Para ela, a arborização vai além de uma paisagem bonita aos olhos:

– A arborização não é só embelezamento e amenização do calor, porque a gente só presta atenção na árvore quando precisa do calor. Geralmente, é assim. Mas tem outras questões. É comprovado cientificamente o bem-estar em áreas verdes. As pessoas se exercitam mais em áreas verdes e com sombra. E o fato de que a arborização também serve para fauna e fluxo genético entre as nossas espécies. 

Para especialistas, não pode existir um plano de arborização sem educação ambiental:

– Deveria ser envolvido em um plano de arborização da cidade local, a formação de grupos de discussão sobre isso, aproveitando CTGs, salões paroquiais ou clubes. A comunidade precisa se envolver, para ela pertencer ao processo. E esse é um dos grandes motivos desse caos na arborização urbana. Não existe um diálogo entre poder público e os atores que participam do processo de arborização – afirma Renato Záchia, do Jardim Botânico. 


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