O cadastramento de carroceiros da cidade, iniciado no final de abril, foi interrompido. Apenas 34 trabalhadores que atuam na coleta de resíduos utilizando a tração animal responderam ao questionário da prefeitura, que pretende fazer um levantamento completo em todas as regiões de Santa Maria. Porém, sequer há prazo para retomada do trabalho.
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O motivo, segundo o veterinário Alexandre Caetano, coordenador do Central de Bem-Estar Animal, alocado na Secretaria de Meio Ambiente é uma mudança de estratégia que visa facilitar o diálogo com os carroceiros, que temem a retirada de suas carroças das ruas de forma arbitrária.
Para isso, há cerca de 15 dias, escolas municipais têm recebido palestras sobre posse responsável, tração animal e demais informações (não restritas a cavalos). Representações comunitárias também têm sido procurados para esclarecimento de ações que pretendem encontrar uma solução para os problemas consequentes do uso das carroças que envolvem aspectos como trabalho irregular, trabalho infantil, saúde pública, maus-tratos animais e trânsito. Em algumas instituições, filhos de carroceiros são alunos.
– Mudamos o foco. Procuramos igrejas e líderes comunitários. Nas escolas, falo sobre saúde bem estar animal, o uso de veículos de tração e da relação entre o ser humano e o animal – relata o veterinário.
Carroceiros: vidas invisíveis ditadas a trote de cavalos
A ação conta com a secretaria de Educação, que integra o Grupo de Trabalho (GT) criado pela prefeitura para tratar do tema. Até a última terça-feira, quatro escolas tinham recebido a palestra.

No próximo mês, a comissão especial da Câmara de Vereadores que também trata dos veículos de tração animal, promoverá um seminário aberto ao público, que deve contar com integrantes da Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC). No encontro, serão relatadas experiências e dificuldades do projeto que retirou as carroças das ruas da Capital.
Após anos de trabalho forçado, aos cavalos, sobra o abandono e os maus-tratos
Embora as iniciativas do Executivo e Legislativo, ainda não há nenhuma sinalização de que seja efetivada em um projeto de lei, com prazos específicos e políticas claras. Um cenário diferente do que acontece em outras cidades do Estado que têm legislação vigente do fim da circulação nas ruas, encaminhamentos ou programas de redução de veículos de tração animal.
Em outras cidades do Estado
Porto Alegre – Lei sancionada 10.531/2008, que determinou um período de oito anos para que os veículos saíssem das ruas. O prazo terminou em setembro do ano passado, mas foi prorrogado por mais seis meses e entrou em vigor em março deste ano
São Leopoldo – Lei 8609/2017 sancionada em junho deste ano. O prazo é de até 2021 para acabar com a circulação nas ruas da cidade
Santa Cruz do Sul – Lei 7646/2016 sancionada em outubro do ano passado. O prazo para retirada das carroças é até outubro de 2020.
Canoas – Lei 6044 sancionada em agosto de 2016. O prazo para retirada definitiva é até oito anos.
Novo Hamburgo – Projeto de lei 32/2017 tramita na Câmara de Vereadores e prevê a retirada gradativa das carroças das ruas em até cinco anos.
MP acompanha situação das crianças sobre carroças
Em maio, a Promotoria de Justiça Especializada de Santa Maria abriu um procedimento para investigar a existência de trabalho infantilem Santa Maria, que segue me andamento.
O promotor Ricardo Lozza acompanhou, inclusive, a audiência pública sobre o tema, no dia 30 de junho. Na ocasião, uma pessoa da comunidade mencionou o boato de que os carroceiros temiam a retirada dos filhos pelo Conselho Tutelar. Isso pelo fato de não terem com quem deixar as crianças e acabarem levando junto no trabalho diário de coleta de materiais.
Segundo Lozza, o ainda não há um panorama de crianças diretamente ligadas ao uso das carroças no município e é preciso cautela:
– Temos de achar uma solução para esse que é um problema social complexo. Não é simples. O próprio Estatuto da Criança e do Adolescente prioriza o convívio familiar e ninguém vai tirar crianças dos seus pais. Temos que ir nas raízes do problema, traçar enfrentamentos e cobrar dos entes públicos.
Nas rodovias ou no Centro, carroças são risco no trânsito de Santa Maria
Em agosto, ainda sem data definida, o promotor tem uma audiência com uma representante da Associação dos Selecionadores de Material Reciclável (Asmar). A ideia é ouvir várias pessoas que tenham a relação com a situação dos carroceiros para elaboração de medidas adequadas.
No último domingo, em Rosário do Sul, uma menina de 2 anos e 6 meses, morreu após um acidente com uma carroça. Ela estava acompanhada dos pais no momento em que o veículo tombou na área central da cidade. A Polícia Civil investiga o caso.