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OPINIÃO: Condenações sem julgamento na sociedade do espetáculo

João Gilberto Lucas Coelho

Um corpo projeta-se no vão central do principal “shopping” de Florianópolis. Suicídio. O reitor da Universidade Federal de Santa Catarina, professor Luiz Carlos Cancellier de Olivo, não suportou ter sido afastado das funções e detido, embora liberado no dia seguinte, numa das muitas operações midiáticas que hoje caracterizam a ação de Ministério Público e Polícia Federal nas investigações sobre suspeitas de crimes e infrações. No caso, uma operação batizada de “ouvidos moucos” (as denominações dadas às operações já são partes do espetáculo planejado para a mídia e para exacerbar emoções) que investiga possíveis desvios de recursos públicos em programa de educação à distância e cujos fatos viriam de gestões anteriores, sendo atribuída ao falecido a suspeita de estar dificultando as investigações.

OPINIÃO: Um país em chamas

Ações midiáticas de coerções e acusações, no início de uma investigação, são assimiladas pela opinião pública como provas definitivas e impõem aos acusados pesadas penas de opróbrio, honra maculada e família desmoralizada, independentemente se os indícios originarão provas ou dos resultados futuros de processos judiciais mesmo que estes sejam de absolvição. Primeiro, as penas, depois, o julgamento. Se for investigado ou acusado é culpado, mesmo sem processo concluído. Ora, na história das investigações criminais já houve até casos de homicídios em que quem apareceu na cena do crime de arma na mão não era o autor da morte: o devido processo legal terminaria por mostrar que outro fora o criminoso!

É preciso investigar toda a suspeita de desvio de conduta. Necessário se faz processar e condenar os responsáveis por crimes.

OPINIÃO: Três atitudes fundamentais para os dias de hoje

 O que desejo afirmar é que os ditos tribunais populares sempre resvalaram para a injustiça. Assim é no caso de linchamentos. Foi na cena bíblica de Pôncio Pilatos perguntando à multidão a quem deveria libertar: Jesus Cristo ou um bandido. Ou no caso dos milhares de guilhotinados na Revolução Francesa. O tribunal popular de hoje é gerado pela mídia, redes sociais e emoção pouco racional da opinião pública. As operações espetaculares de Ministério Público e Polícia Federal alimentam o pré-julgamento. Não há a sensatez de quem acompanha o cotidiano das investigações de pensar: os órgãos acusadores estão reunindo indícios e possíveis provas; num processo judicial, a defesa vai contestá-las; penas só deverão existir quando comprovada a culpa no julgamento.

OPINIÃO: Estatais, para que as quero

Que o corpo estendido num “shopping” de Florianópolis represente reflexão sobre o apego dos órgãos responsáveis por investigação e persecução penal ao escândalo e ao espetáculo. E, para nós, cidadãos, que a exigência de passar a limpo instituições brasileiras não se transforme em tribunal ensandecido de opinião pública onde notícia, foto, vídeo ou acusação inicial se transformem em julgamento e condenação antes do devido processo judicial.


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