Consumo de água de poços artesianos: pode ou não pode? Entenda o que diz a lei

Consumo de água de poços artesianos: pode ou não pode? Entenda o que diz a lei

Entre leis municipais, resoluções e regulamentações estaduais, a legalidade e os procedimentos para a utilização de poços artesianos em Santa Maria ainda são motivo de dúvidas e debates entre os moradores. No fim do ano passado, o assunto ganhou um novo capítulo, e agora, a discussão gira em torno do consumo da água destes poços. Enquanto o Estado diz que a utilização da água como fonte para consumo humano só é legal em áreas onde não há rede pública disponível, uma lei municipal autoriza a utilização de água do poço artesiano como fonte alternativa para o consumo humano. Mas, afinal, o que dizem essas leis e qual orientação o município deve seguir? Entenda abaixo:

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Santa Maria

Atualmente, o município conta com duas leis sobre o assunto — ambas de autoria do vereador Tubias Callil (PL). A primeira, aprovada em 15 de outubro de 2024​, diz o seguinte:

  • A lei permite o uso de fontes de água naturais e alternativas, como os poços artesianos;
  • Essas fontes devem atender aos padrões de potabilidade exigidos;
  • A água precisa ser analisada em laboratório para confirmar que é própria para o consumo humano;
  • Quando a fonte de água for destinada ao consumo humano, é necessário apresentar certificado de potabilidade e laudos anuais atualizados sobre a situação físico-química e microbiológica da água.

Já a lei nº 6.979, aprovada no dia 26 de dezembro de 2024, motivo da polêmica envolvendo o assunto, diz que:

  • A lei autoriza o uso de água de poço artesiano como fonte alternativa para consumo humano, conforme a Lei Federal nº 9.433/1997;
  • A água do poço artesiano só poderá ser utilizada para consumo humano se for potável, ou seja, deve atender aos padrões exigidos;
  • A potabilidade deve ser confirmada através de análise técnica específica;
  • As instalações e utilizações dos poços artesianos devem cumprir as legislações federal, estadual e municipal em vigor;
  • Essas instalações estarão sujeitas à fiscalização periódica dos órgãos públicos responsáveis.

Estado

No Estado, o aumento da fiscalização deste tipo de fonte alternativa ficou ainda mais rígido após determinação feita pelo Ministério Público (MP) em 2008, a partir de uma investigação que apontou a existência de diversos poços artesianos considerados irregulares. A medida, que teve sentença em 2011, condenou o RS ao levantamento e fiscalização dos locais com poços artesianos, prevendo o fechamento daqueles em situação irregular.  Em 2018, Santa Maria se tornou pioneira na adequação da lei de poços artesianos.

Fiscalização 

Atualmente, a fiscalização dos poços é feita pela Secretaria Estadual de Meio Ambiente (Sema), através do Departamento de Recursos Hídricos (DRH). Em 2023, através de um termo de cooperação, a Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan) também começou a fazer parte das ações de fiscalização junto do MP e Estado.


Motivação

Em entrevista ao Diário, Callil explica que a constante falta de água no município foi um dos motivos que motivou a criação da lei. Segundo ele, a decisão de não permitir o consumo humano da água dos poços é uma estratégia da empresa responsável pela Corsan, na intuição de dificultar o consumo próprio e estimular a compra de água tratada pela companhia. A qualidade da água também foi um ponto citado por Callil.

— O governo do estado era dono da Corsan, e tinha muito poço artesiano que eles não estavam conseguindo cobrar a água. Sabe o que eles fizeram? O governo do Estado, na época, fez uma normativa interna proibindo o uso e o consumo de água de poço artesiano aonde onde passa a rede da Corsan. Isso é uma vergonha. Ou seja, tu está obrigando as pessoas a pegar água da Corsan. [...] As pessoas precisam ter direito à água, e esse direito foi tirado delas — explica Callil.

Como alternativa, ele sugere o rompimento da Corsan e a criação de uma empresa municipal de água e esgoto, e cita o exemplo de Porto Alegre, no caso do Departamento Municipal de Água e Esgotos (Dmae), e São Gabriel, com a São Gabriel Saneamento (SGSSA). Pensando nisso, o vereador criou um projeto de lei que autoriza a criação de uma empresa municipal de saneamento, água e esgoto no município.

— Os municípios estão fazendo a sua parte, só tem que enfrentar esse assunto. Muitos municípios devem romper com a Corsan. Por quê? Porque não estão entregando o que foi combinado. Então, essa lei foi apresentada como forma de ajudar, dar uma solução para isso.

Poços fechados

Em 2024, 12 poços artesianos sem licença foram fechados em Santa Maria. Dois deles abasteciam o Residencial Arco Verde, na BR-158, e foram fechados em abril. O espaço, com mais de 720 apartamentos e sete lojas em funcionamento, fazia uso da água dos poços, inclusive para consumo humano, há mais de 20 anos, segundo a sub síndica Lucimar Silva de Vargas, de 50 anos.

A equipe entrou com outro pedido para a liberação da ortoga através do site do Sistema de Outorga de Água do Rio Grande do Sul (Siout), e agora aguarda os próximos passos. Essa é a segunda vez que o processo é iniciado, mas segundo a gestão, não foi concluído anteriormente por ser muito burocrático. 

Desde então, o abastecimento é feito através da Corsan. Além do aumento significativo do preço da conta de água, que subiu de R$ 64 mil esse mês passou para R$127.909,15, as condições da água não tem agradado os moradores:

— Água muito suja, cheiro horrível. A do poço antes era cristalina, sempre fazíamos exames. Agora, as roupas ficam horríveis, amareladas. Para escovar os dentes, moradores relatam que chega dar ânsia de vômito pelo cheiro da água - relata Lucimar.


E aí, quem o município deve seguir?

Em contato com a Secretaria do Meio Ambiente e Infraestrutura (Sema), através do Departamento de Recursos Hídricos e Saneamento, foi esclarecido que água de poços artesianos não pode ser utilizada para consumo humano em locais que já possuem rede pública de abastecimento de água. A medida é respaldada pela Resolução do Conselho de Recursos Hídricos do Rio Grande do Sul - CRH Nº 255/2017, juntamente com o Decreto Estadual nº 23.430/1974, que visam garantir a qualidade da água consumida pela população.

Ou seja, mesmo com a lei municipal, o consumo ainda não é permitido em determinadas áreas (as que não tem rede de água). Mesmo que a decisão seja baseada em uma resolução, o que foi decidido pelo Estado fica acima de qualquer lei municipal.


Confira a nota completa abaixo:

A Secretaria do Meio Ambiente e Infraestrutura, por meio do Departamento de Recursos Hídricos e Saneamento (DRHS), informa que a legislação estadual estabelece que a água de poços artesianos não pode ser utilizada para consumo humano em locais que já possuem rede pública de abastecimento de água. Essa medida é respaldada pela Resolução do Conselho de Recursos Hídricos do Rio Grande do Sul - CRH Nº 255/2017, juntamente com o Decreto Estadual nº 23.430/1974, que visam garantir a qualidade da água consumida pela população.


A utilização de poços artesianos para consumo humano é permitida apenas em áreas onde não há rede pública disponível, e desde que atendidas todas as exigências técnicas, como a comprovação da potabilidade da água por meio de análises laboratoriais e a autorização da Secretaria Municipal da Saúde. Em caso de descumprimento da legislação, como o uso de poços sem a devida outorga, o infrator está sujeito a penalidades, incluindo multas, conforme o Decreto Estadual nº 55.374/2020



O que diz a Lei Federal nº 9.433/1997?

Lei nº 9.433, de 8 de janeiro de 1997, é a Lei das Águas no Brasil. Ela estabelece a Política Nacional de Recursos Hídricos, com o objetivo de assegurar à população a utilização adequada dos recursos hídricos do país, promovendo a conservação e a gestão sustentável dessas águas. Essa lei regulamenta a distribuição, uso e gestão dos recursos hídricos, além de definir os instrumentos necessários para essa gestão, como o Plano Nacional de Recursos Hídricos, os planos de bacia hidrográfica, entre outros.

Agora, falando especificamente sobre poços artesianos, a Lei nº 9.433/1997 trata da utilização dos recursos hídricos subterrâneos no artigo 16, que estabelece que:

  • utilização de recursos hídricos subterrâneos (como a perfuração de poços artesianos) também deve ser regulada, e depende de outorga. Ou seja, não se pode perfurar poços artesianos sem a devida autorização dos órgãos competentes, como as secretarias estaduais de meio ambiente ou agências reguladoras que cuidam do uso dos recursos hídricos.
  • Essa outorga é necessária para garantir que o uso dos recursos hídricos subterrâneos seja feito de forma equilibrada, sem comprometer a quantidade e qualidade da água disponível, além de evitar a exploração de forma excessiva ou prejudicial aos ecossistemas.

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Vitória Parise

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