Dez anos após sacudir o meio político gaúcho, em particular o governo do Estado, e abalar a estrutura de duas fundações de apoio da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), a Operação Rodin ainda não teve um desfecho final. Na segunda-feira, a Rodin completa uma década em meio a uma acirrada batalha jurídica, e, a partir deste sábado O Diário publica uma série de reportagens sobre o caso. A primeira delas mostra como vivem hoje os 22 réus que ainda respondem processo criminal, as penas a que foram condenados e a expectativa em relação ao julgamento de recursos em segunda instância.
Deflagrada em 6 de novembro de 2007 pelo Ministério Público Federal e pela Polícia Federal, a Rodin desmontou um suposto esquema envolvendo a contratação de empresas para elaboração e aplicação de exames para obtenção da carteira de motorista no Rio Grande do Sul, que eram coordenados em Santa Maria. Apesar de condenações em duas instâncias, nenhum dos 22 réus restantes cumpriu pena.

A expectativa dos advogados é pela absolvição dos clientes ou anulação das penas, mas há também a possibilidade de prescrição (extinção da punibilidade devido ao tempo). Eles ainda poderão recorrer a instâncias superiores, como o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o Supremo Tribunal Federal (STF). Parte dos condenados está aposentada, uns se dedicam a escrever livros com suas versões sobre o caso, e outros seguiram ou voltaram a atuar em suas áreas. Na imagem abaixo, clique no nome de cada um para ver como estão os 22 condenados em segunda instância.
COMO FUNCIONAVA O ESQUEMA
- Em 2003, o Detran fechou contrato com Fundação de Apoio à Tecnologia e à Ciência (Fatec) para a elaboração das provas da Carteira Nacional de Habilitação, mas dividia a tarefa e 80% do faturamento com outras empresas. Porém, a subcontratação era irregular, já que as empresas eram contratadas para prestar serviços que deveriam ser feitos pela Fatec
- A Fatec, à época, subcontratou empresas para o serviço. Uma delas foi a Pensant, tida como mentora da fraude. De propriedade de José Antônio Fernandes e dos seus filhos, a empresa teria recebido, até 2006, R$ 8,9 milhões da Fatec. Em 2005, mais de 90% dos rendimentos da empresa vinham da fundação.
- A Pensant, segundo a PF, faria parte de um sistema de distribuição de propina a diretores do Detran, corrupção paga pelas empresas que prestavam serviço à autarquia
- Em 2007, sobre o pretexto de uma economia de 8%, a Fundação Educacional e Cultural para o Desenvolvimento e Aperfeiçoamento da Educação e da Cultura (Fundae) foi contratada pelo Detran e assumiu os exames práticos e teóricos para a carteira de motorista, quando teria ocorrido uma racha do grupo com o empresário Lair Ferst, que teriam deixado de fora do esquema e mais tarde virou o delator da fraude.
- O esquema montado se valeria de dinheiro público para o financiamento de campanhas de partidos e ainda haveria a distribuição de propinas a agentes públicos, e, políticos e a professores da UFSM
O PROCESSO
O processo penal principal aguarda julgamento de recursos de 22 réus condenados em segunda instância, no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), e não há uma data para a sentença definitiva no órgão. A ação penal, considerada a maior da Justiça Federal Gaúcha, com 251 volumes e 200 mil páginas, é resultado de uma investigação iniciada em março de 2007,quando um professor da UFSM denunciou ao MPF um suposto esquema envolvendo as duas fundações de apoio da instituição de ensino, a Fundação de Apoio à Ciência e Tecnologia (Fatec) e a Fundação Educacional e Cultural para o Desenvolvimento e o Aperfeiçoamento da Educação e da Cultura (Fundae).

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No dia da operação, 13 prisões foram realizadas em Santa Maria, sede da UFSM e das fundações; em Porto Alegre, e em Canoas, onde ficava a sede da Pensant Consultores, empresa de propriedade do professor aposentado da UFSM José Antônio Fernandes, apontado como mentor da fraude. Daí o nome Rodin, inspirado na obra O Pensador, do escultor francês René-François-Auguste Rodin.
Entre os presos na manhã de 6 de agosto de 2007 estavam Fernandes e dois filhos, Fernando e Ferdinando, que atuavam na Pensant. Entre os presos em Santa Maria, naquele dia, estava o também professor da UFSM Dario Trevisan de Almeida, coordenador do Programa Trabalhando pela Vida, desenvolvido pela Fatec para qualificação de instrutores e examinadores de trânsito. Eles foram soltos dias depois.
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O esquema gigantesco envolvia, sob o guarda-chuva da Pensant, a contratação irregular (sem licitação) de fundações e de empresas, as chamadas sistemistas, que prestavam serviços ao Detran, principalmente na área de consultoria. Entre agosto de 2003, quando a Fatec assinou contrato com o Detran, e 2007, ano da Rodin, teriam sido desviados R$ 90,6 milhões, conforme a última atualização, feita em dezembro do ano passado.
TRF4 julga mais um recurso da Rodin e altera pena de um dos réus
Das 32 pessoas inicialmente denunciadas pelo MPF, 29 foram foram condenadas em primeira instância, pelo juiz Loraci Flores de Lima, da Justiça Federal de Santa Maria, em sentença proferida em 23 de maio de 2014. No TRF4, sobraram 22 réus condenados. Há ainda desdobramentos em ações por improbidade administrativa (não criminal), principalmente contra políticos com mandato, entre eles a ex-governadora e hoje deputada federal Yeda Crusius (PSDB). Em setembro, a Justiça ouviu testemunhas na ação contra Yeda, que ainda não foi julgada. O MPF quer a devolução dos recursos supostamente desviados.
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A assessoria de Yeda reitera que a ex-governadora não fala sobre a Rodin e desautorizou seus advogados de comentar o assunto. O advogado José Antonio Boschi, que representa o deputado federal José Otávio Germano (PP), na ação de improbidade, aposta na absolvição do político no TRF4.
– Essa ação foi toda estruturada nas provas do processo criminal que o Supremo Tribunal Federal entendeu como provas ilegais porque foram produzidas pelo MPF sem licença prévia do STF. Sustento que, se essas provas são ilegais, elas não poder ser usadas em lugar nenhum – argumenta Boschi, que recorreu da condenação na Justiça de Santa Maria.