A Justiça não é apenas uma promessa constitucional. É uma prática cotidiana, que se realiza – ou se corrompe – em cada decisão, sentença ou julgamento. Nos últimos dias, uma série de acontecimentos evidenciou o quão tênue é a linha entre a aplicação correta da lei e o risco de sua distorção. Ao analisar seis casos recentes, emergem lições fundamentais para quem se dedica ao Direito: a técnica deve prevalecer sobre o arbítrio, e a legalidade jamais pode ser sacrificada em nome da conveniência.
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STJ reafirma: gravidade abstrata não justifica regime fechado
No dia 8 de maio, o Superior Tribunal de Justiça reiterou que a gravidade abstrata do crime não justifica, por si só, a imposição do regime fechado. A decisão reafirma um princípio básico da dogmática penal: a pena deve ser aplicada de forma individualizada, considerando as circunstâncias concretas e as características do réu. O contrário seria uma rendição ao automatismo punitivista.
Procurador aposentado condenado por vantagens indevidas
Em 11 de maio, um procurador aposentado foi condenado por receber vantagens em troca de nomeações para perícias. O caso expõe a face sombria do abuso de poder e da corrupção institucional – vícios que corrompem o sistema de justiça de dentro para fora. A confiança pública é minada não apenas pelo crime em si, mas pelo exemplo negativo dado por aqueles que deveriam ser guardiões da integridade institucional.
Quebra na cadeia de custódia gera absolvição
No dia 7 de maio, o STJ anulou condenações por roubo ao reconhecer que houve quebra na cadeia de custódia das provas. A decisão reforça o óbvio: a prova penal não é um adereço opcional, mas o fundamento do juízo condenatório. Sem respeito às garantias técnicas e processuais, o processo se converte em mera formalidade, incapaz de assegurar a justiça.
Supremo analisa suspensão de ação contra Ramagem
Em 9 de maio, o Supremo Tribunal Federal iniciou o julgamento que decidirá se a Câmara dos Deputados pode suspender uma ação penal contra o deputado Alexandre Ramagem. O caso é emblemático: a interferência política na esfera judicial representa uma ameaça constante ao equilíbrio entre os Poderes. Quando o interesse político se sobrepõe à aplicação imparcial da lei, o sistema de justiça se enfraquece.
STM mantém investigação de fraude em licitação no Exército
Em 8 de maio, o Superior Tribunal Militar negou habeas corpus e manteve o andamento de uma investigação por fraude em licitação no Exército. A decisão reforça a importância do controle e da transparência, mesmo em ambientes historicamente blindados ao escrutínio público. O combate à corrupção não deve conhecer zonas de imunidade institucional.
Lula sanciona lei que aumenta penas para crimes contra juízes
Também em 8 de maio, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou a lei que eleva as penas para crimes cometidos contra membros do Judiciário. A medida, embora legítima na proteção funcional, revela um viés corporativista, contrastando com a omissão do Estado em relação a outras categorias igualmente expostas à violência.
Justiça não é instinto: é método e compromisso
As decisões analisadas não são apenas fatos isolados. Elas compõem o mapa das escolhas que moldam o sistema de justiça em nosso tempo. Em cada julgamento, revela-se o embate entre a legalidade e o arbítrio, entre o compromisso com os direitos e a tentação do automatismo punitivo. Como advogado criminalista e professor, sei que a técnica não é um detalhe: é o alicerce que separa o julgamento racional da reação impulsiva. Defender a legalidade não é proteger o erro, mas garantir que o poder não se converta em abuso. E onde não há método, não há justiça.